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28 junho 2025

Disciplina na Igreja

A disciplina eclesiástica, um assunto de profunda relevância para a pureza e a saúde da Igreja, emerge como um ponto importante em nossos dias. Precisamos considerar que é um tema bíblico e, por isso, é necessário um estudo abrangente sobre seus fundamentos, evolução histórica, propósitos e desafios contemporâneos. Este texto tem a intenção de mostrar que a disciplina não é uma prática periférica, mas um distintivo intrínseco da verdadeira Igreja de Cristo, conforme articulado em confissões reformadas e nos ensinamentos apostólicos.

Símbolos Confessionais são unânimes em afirmar que a disciplina eclesiástica é uma das marcas essenciais que distinguem a Igreja verdadeira. A Confissão Belga, de 1561, escrita por Guido de Brés, já apontava que, junto à pregação pura do Evangelho e à correta administração dos sacramentos, o exercício da disciplina para castigar os pecados é fundamental. Essa tríplice marca é reforçada pela Confissão de Fé de Westminster que dedica um capítulo inteiro (capítulo XXX) à importância e à responsabilidade dos oficiais da Igreja em sua execução. A negligência dessa marca é vista como um fator que compromete a pureza da Igreja, ofuscando sua identidade e integridade diante do mundo.

A Confissão de Fé Escocesa declara que as marcas da verdadeira Igreja são: a verdadeira pregação da Palavra de Deus, a correta administração dos sacramentos de Jesus Cristo e, finalmente, a disciplina eclesiástica corretamente administrada, como prescreve a Palavra de Deus, para reprimir o vício e estimular a virtude. O Catecismo de Heidelberg explica que as "chaves do reino dos céus" são exercidas pela pregação do evangelho e pela disciplina cristã. Ele afirma que a igreja cristã tem a obrigação de excluir pessoas que se mostram incrédulas e ímpias, até que demonstrem arrependimento. 

A Segunda Confissão Helvética afirma que os ministros legitimamente chamados exercem as "chaves do Reino de Deus" quando "repreendem e exercem a disciplina sobre o povo confiado aos seus cuidados", abrindo o Reino dos Céus aos obedientes e fechando-o aos desobedientes. Além disso, destaca que "a disciplina é absolutamente necessária na Igreja". A Confissão de Fé Batista de Londres de 1689 menciona que Deus concedeu à Igreja "todo poder e autoridade necessários ao desempenho da forma de adoração e de disciplina por Ele instituídas para a observância na igreja". Os membros da igreja estão sujeitos à "disciplina e ao governo da igreja". Os Cânones de Dort mencionam que os apóstolos e mestres não descuidaram de manter o povo "sob a ministração da Palavra, dos sacramentos e da disciplina". Por fim, a Confissão de Fé de Guanabara descreve o governo da igreja verdadeira como aquele em que os "desvios sejam corrigidos e reprimidos" para manter a pureza da doutrina.

Fundamentação Bíblica da Disciplina

A base para a disciplina eclesiástica é solidamente encontrada nas Sagradas Escrituras, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, por meio do princípio do Progresso da Revelação. No Antigo Testamento, a santidade de Israel, pautada em ordenanças divinas, exigia a eliminação do pecado para manter a distinção do povo de Deus (Levítico 11:44-45). As punições severas serviam como advertência e para o bem-estar da congregação. O exílio na Babilônia é até mesmo interpretado como um modelo de disciplina divina visando arrependimento e obediência, culminando na restauração (Esdras 10:8). Embora as punições literais do Antigo Testamento não sejam válidas hoje, os princípios de que o pecado não deve ficar impune e de que o povo de Deus deve ser santo permanecem.

No Novo Testamento, Jesus e os apóstolos estabelecem o modelo para a aplicação da disciplina. Mateus 18:15-17 é a passagem primordial, delineando os passos: a admoestação particular (v. 15), o envolvimento de uma ou duas testemunhas (v. 16), e, se o pecador persistir, o assunto é levado à igreja (v. 17). Russell P. Shedd, em seu livro Disciplina na Igreja, afirma que não há passagem mais clara no Novo Testamento sobre a importância da disciplina.

Outras passagens cruciais incluem 1 Coríntios 5, que aborda o caso de imoralidade sexual pública na igreja de Corinto, instruindo a excomunhão do ofensor para a destruição da carne e salvação do espírito (1 Coríntios 5:1-5). Paulo também exorta a igreja a "expulsar o malfeitor" (1 Coríntios 5:13). A analogia do fermento (1 Coríntios 5:6-8) é usada para ilustrar como o pecado contamina toda a massa, justificando a ação disciplinar. Tito 3:10-11 instrui a admoestar o homem faccioso duas vezes e depois evitá-lo, indicando a disciplina para aqueles que causam divisões e ensinam heresias. 2 Tessalonicenses 3:6, 14-15 aborda a disciplina de irmãos que vivem desordenadamente, não trabalhando e se intrometendo na vida alheia, indicando o afastamento para que se envergonhem. 1 Timóteo 5:20 enfatiza a repreensão pública de pecadores contumazes "para que também os demais temam".

Um dos conceitos teológicos mais relevantes para a disciplina é o das "chaves do reino dos céus", outorgadas por Jesus à Sua Igreja (Mateus 16:18-19). Essa autoridade, simbolizada pelas chaves, refere-se ao poder de "ligar e desligar" ou "reter e remitir pecados". Estudiosos explicam que "ligar" e "desligar" se aplica tanto à pregação do evangelho e à admissão de penitentes na comunhão da igreja, quanto à exclusão daqueles que persistem no pecado. James Bannerman, em seu livro A Igreja de Cristo, destaca que essa linguagem não confere à Igreja o poder de perdoar a culpa eterna dos pecados, mas sim a autoridade de aplicar e remover censuras eclesiásticas em referência aos privilégios e punições exteriores da transgressão. Essa autoridade é exercida coletivamente pelos oficiais da igreja, como um presbitério, e não por um único indivíduo.

O propósito da disciplina eclesiástica é multifacetado e visa, antes de tudo, à pureza da Igreja. As fontes enumeram diversos objetivos:

• Restauração do pecador: O principal objetivo é levar o pecador ao arrependimento e à reconciliação com Deus e com a comunidade (Mateus 18:15; 1 Coríntios 5:5; Gálatas 6:1; Tiago 5:19-20).

• Manutenção da pureza e da santidade da Igreja: A disciplina serve para purificar a Igreja, removendo o "fermento" do pecado que poderia corromper toda a massa (1 Coríntios 5:6-8).

• Dissuasão de outros: A repreensão pública de pecadores contumazes serve como advertência para que outros não cometam pecados semelhantes (1 Timóteo 5:20).

• Vindicação da honra de Cristo e do Evangelho: A disciplina protege o nome de Cristo da desonra causada pelo pecado não tratado.

• Prevenção da ira de Deus: Ao lidar com o pecado, a Igreja evita que a ira de Deus caia sobre a comunidade por tolerar a profanação de seu pacto e sacramentos.

• Obediência e crescimento espiritual: A prática da disciplina demonstra a obediência da Igreja a Deus e promove o crescimento espiritual dos membros.

Os líderes eclesiásticos, sejam pastores ou presbíteros, têm uma responsabilidade primordial na administração da disciplina. Eles são vistos como pastores que prestarão contas a Deus por cada ovelha sob seu cuidado (Atos 20:28; Hebreus 13:17). A autoridade para "ligar e desligar" é confiada a esses oficiais, que a exercem de forma colegiada, e não individualmente, em contraste com o modelo católico-romano ou episcopal. O conselho da igreja, formado pelo pastor e presbíteros, é o corpo responsável pela aplicação da disciplina. A supervisão moral da congregação é parte integrante do trabalho dos presbíteros.


Tipos de Pecados e Níveis de Disciplina

Podemos distinguir entre diferentes tipos de pecados e os níveis apropriados de disciplina. Pecados podem ser classificados como:

• Pecados Privados/Secretos: Devem ser admoestados secretamente, começando com uma confrontação individual (Mateus 18:15).

• Pecados Públicos/Notórios: Aqueles que causam escândalo e são amplamente conhecidos devem ser tratados publicamente (1 Timóteo 5:20; 1 Coríntios 5).

Os passos da disciplina corretiva, conforme Mateus 18, são:

1. Abordagem individual: O ofendido procura o ofensor em particular, buscando o arrependimento.

2. Admoestação com testemunhas: Se o pecador não ouvir, uma ou duas testemunhas são levadas para que a palavra seja estabelecida.

3. Comunicação à Igreja: Se o pecador ainda assim não atender, o assunto é levado ao conhecimento da igreja (ou seus representantes, como o conselho de presbíteros).

4. Excomunhão/Exclusão: Se o pecador se recusar a ouvir a igreja, deve ser considerado "como gentio e publicano", ou seja, excluído da comunhão (Mateus 18:17). A excomunhão é a medida mais severa, reservada para pecados graves, notórios e impenitentes. No entanto, ela deve ser aplicada com o objetivo final de restauração, não de destruição.

O Legado dos Reformadores (Calvino, Knox, Bucer)

A Reforma Protestante foi crucial para o resgate da disciplina eclesiástica, que havia sido deturpada na Igreja Medieval. Martin Bucer (1491-1551) é reconhecido como uma influência significativa sobre João Calvino (1509-1564), especialmente em temas eclesiológicos e na prática da disciplina. Calvino, durante sua estadia em Estrasburgo (1538-1541), amadureceu seu pensamento teológico e incorporou ênfases de Bucer, embora suas ideias já estivessem em germe em suas obras anteriores, como as Institutas de 1536.

Heber Carlos de Campos Júnior, em seu artigo A Doutrina de Calvino sobre Disciplina Eclesiástica foi Principalmente Resultado da Influência de Martin Bucer?, conclui que, embora a influência de Bucer seja clara em tópicos como o uso dos Pais da Igreja, a reação aos anabatistas e a distinção entre níveis de pecado, não se pode afirmar que essa foi a principal ou única influência, já que as próprias experiências pastorais de Calvino e seu amadurecimento teológico foram determinantes. Contudo, Bucer tinha uma visão mais ampla da disciplina, incluindo instrução religiosa, confissão pública, admoestação fraterna e supervisão moral, e a imposição de penitência ou excomunhão para pecados graves. A criação do Consistório em Genebra por Calvino, um corpo com leigos e clérigos para supervisionar a moral, é vista como um resultado de sua experiência e das ideias de Bucer.

João Knox, principal figura da Reforma na Escócia, também foi influenciado por Calvino, integrando os interesses disciplinares calvinistas na administração da Igreja Presbiteriana da Escócia. O Primeiro Livro da Disciplina, coautorado por Knox, estabeleceu o desenvolvimento inicial da disciplina escocesa, distinguindo entre pecados públicos e privados, e prevendo a excomunhão como a sanção máxima para impenitentes.

O Declínio da Disciplina na Igreja Contemporânea

No entanto, devemos expressar grande preocupação com o declínio e a negligência da disciplina em muitas igrejas evangélicas hoje. Este fenômeno é atribuído a vários fatores:

• Pobreza Bíblica e Falta de Preparo Pastoral: Muitos pastores carecem de preparo sobre como implementar a disciplina eclesiástica, e os currículos de seminários tendem a subenfatizá-la em contraste com a pregação e os sacramentos.

• Evangelho Diluído e Pensamento Pós-moderno: Há uma resistência à disciplina devido a um evangelho diluído que enfatiza a felicidade terrena e o crescimento numérico, bem como o relativismo moral pós-moderno, onde "a verdade é relativa e cada pessoa tem sua própria verdade".

• Medo de Ações Legais e Diminuição de Membros: O medo de litígios e a preocupação com a redução do número de membros fazem com que as igrejas evitem a aplicação formal da disciplina.

• Tecnicismo e Linguagem Jurídica: A complexidade dos manuais disciplinares, com sua linguagem técnica e extensos procedimentos, pode ser um impedimento para a liderança.

A negligência da disciplina é vista como uma desobediência a Deus que compromete a saúde da igreja e sua existência.

A Importância da Harmonia, Unidade e Amor Fraternal

Embora a disciplina seja corretiva, precisamos destacar que ela deve ser aplicada com amor, gentileza e com o objetivo de reconciliação e restauração. O Concílio de Jerusalém em Atos 15 é apresentado como um modelo de como a Igreja Primitiva lidava com controvérsias e desavenças de forma consensual e pastoral, fundamentada na Palavra de Deus. A busca pela unidade e harmonia, pautada na fé comum e na oração, cria um ambiente propício para a resolução de conflitos e para a aplicação eficaz da disciplina. A disciplina deve ser um "remédio de salvação" para o pecador, visando seu arrependimento.

A disciplina não é apenas uma tarefa dos oficiais, mas um ministério de toda a Igreja. Começa com a autodisciplina individual. Jay E. Adams, em seu livro Handbook of Church Discipline, e Stephen Davey, em seu livro Disciplina Eclesiástica, corroboram que a palavra "disciplina" compreende métodos educativos e instrutivos, além de atitudes corretivas. A santidade é algo comunitário, e cada crente é responsável por zelar pela pureza da Igreja. O livro Entendendo a Disciplina da Igreja, de Jonathan Leemanenfatiza que cada membro tem um trabalho a fazer, incluindo participar da disciplina, confrontando o pecado em amor, inicialmente de forma privada, e progredindo para os níveis mais públicos se o arrependimento não ocorrer. A disciplina funciona melhor em uma cultura eclesiástica marcada pelo encorajamento e pelo amor, onde as pessoas se conhecem e confiam umas nas outras.

Em resumo, a disciplina eclesiástica é uma ordenança divina e uma bênção para o povo de Deus, fundamental para a preservação da pureza da Igreja, a honra do nome de Cristo e a restauração do pecador. Seu fiel exercício, enraizado em princípios bíblicos e temperado pelo amor pastoral, é um imperativo para qualquer congregação que deseje ser fiel ao Senhor e manifestar um testemunho eficaz no mundo.


26 junho 2025

A Nação de Israel nos Símbolos de Fé de Westminster

Este texto tem a intenção de mostrar o entendimento dos Puritanos, através dos documentos que eles mesmo redigiram no século XVII, sobre o que eles pensavam a respeito da nação de Israel. As declarações da Confissão de Fé, do Catecismo Maior e do Breve Catecismo são exposições do pensamento puritano, o qual entendo ser a interpretação mais próxima das Escrituras.

Os Símbolos de Fé de Westminster esclarecem que Israel, como nação, foi historicamente o povo de Deus no Antigo Testamento. Contudo, o conceito de "povo de Deus" se expandiu para incluir a Igreja, composta por crentes de todas as nações, após a vinda de Cristo. Este estudo pretende detalhar essa compreensão, abordando o papel de Israel no plano divino e a transição para a universalidade da Igreja no pensamento puritano.

1) Israel como Povo de Deus no Antigo Testamento

Os Símbolos de Fé de Westminster explicitam que Israel era o povo escolhido por Deus para um propósito especial no Antigo Testamento.

✔ Pacto Divino: Deus estabeleceu um pacto específico com Israel, libertando-os da escravidão. O prefácio dos Dez Mandamentos, conforme a Pergunta 43 do Breve Catecismo de Westminster e a Pergunta 101 do Catecismo Maior de Westminster, declara: “Eu sou o SENHOR teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”. O Catecismo Maior de Westminster ainda enfatiza que, nessas palavras, Deus se manifesta como "um Deus em pacto com todo o seu povo e com o Israel antigo".

✔ Igreja sob Tutela: Israel era considerado uma "Igreja sob sua tutela". A Confissão de Fé de Westminster (Capítulo III, Seção IV) afirma que Deus deu a Israel "leis cerimoniais que contêm diversas ordenanças típicas", considerando-os uma Igreja sob sua orientação.

✔ Guardiões das Escrituras: As Escrituras do Antigo Testamento foram originalmente escritas em hebraico, a "língua original do antigo povo de Deus" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo I, Seção VIII). Além disso, "aos judeus foram confiados os oráculos de Deus", como citado na Confissão de Fé de Westminster (Capítulo I, Seção III, com referência a Romanos 3:2; e Catecismo Maior de Westminster, Pergunta 4).

✔ Origem da Salvação: A salvação teve sua origem nos judeus, como afirmado em João 4:22 e no Capítulo XXI, Seção V da Confissão de Fé de Westminster: “a salvação vem dos judeus”.

✔ Cristo como Rei de Israel: Cristo, como Redentor, exerce o ofício de Rei e é reconhecido como "o Rei de Israel!" conforme João 1:49, citado na Pergunta 23 do Breve Catecismo de Westminster.

2) A Transição e a Igreja como o Povo de Deus no Novo Testamento

Com a vinda de Cristo, houve uma mudança fundamental na relação de Deus com seu povo, culminando na universalização da Igreja.

✔ Abolição das Leis Cerimoniais e Judiciais: As leis cerimoniais e judiciais dadas a Israel foram "todas abolidas sob o Novo Testamento" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XIX, Seção III), e as leis judiciais "deixaram de vigorar quando o país daquele povo também deixou de existir" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XIX, Seção IV). Isso indica uma mudança na forma de relacionamento de Deus com seu povo e o cumprimento do propósito nacional de Israel em sua forma anterior.

✔ Pacto da Graça Universal: O pacto da graça, base da relação de Deus com seu povo, é feito "com Cristo, como o segundo Adão; e, nele, com todos os eleitos, como sua semente" (pergunta 31 do Catecismo Maior de Westminster). Este pacto é uma continuidade da promessa feita a Abraão, visando que a "bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI e pergunta 34 do Catecismo Maior de Westminster, também Gálatas 3:14). A justificação de Deus é "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem; porque não há distinção" entre judeus e gentios (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI; pergunta 70 do Catecismo Maior de Westminster e pergunta 35 do Catecismo Maior de Westminster).

✔ Natureza Universal da Igreja: A Igreja visível não está mais restrita a uma nação. Sob o Evangelho, a graça e a salvação são manifestadas "em maior plenitude, evidência e eficácia a todas as nações" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI; Catecismo Maior de Westminster, pergunta 35). Jesus ordenou que se fizessem discípulos de "todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo". A pregação do arrependimento para a remissão de pecados deve ser feita "a todas as nações, começando de Jerusalém".

✔ Terminologia Aplicada à Igreja: A Igreja é descrita com termos que antes se aplicavam a Israel, como "raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus" (1 Pedro 2:9), mostrando que os crentes, tanto judeus quanto gentios, agora formam o povo de Deus. A Igreja visível, sob o Evangelho, "não sendo restrita a uma nação, como antes, sob a Lei", agora é "católica ou universal", composta por "todos aqueles que, pelo mundo inteiro, professam a verdadeira religião, juntamente com seus filhos" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XXV, Seção II; Catecismo Maior de Westminster, pergunta 62).

✔ Batismo como Sinal da Nova Aliança: O Batismo, como sinal e selo da aliança, é aplicado não apenas aos que professam fé, mas também aos "filhos de pais crentes (ainda que só um deles o seja)" (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXVIII, Seção IV). Isso é análogo à circuncisão no Antigo Testamento (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXVIII, Seção I; Catecismo Maior de Westminster pergunta 165; Breve Catecismo de Westminster pergunta 94), que era o "selo da justiça da fé" para Abraão, tornando-o "o pai de todos os que creem", independentemente de serem circuncidados ou não. Isso reitera a inclusão de todos os crentes e seus descendentes na aliança.

✔ Essa continuidade demonstra a inclusão de todos os crentes e seus descendentes na aliança, uma vez que o pacto da graça, sob o evangelho, manifesta-se "com mais plenitude, evidência e eficácia espiritual a todas as nações – tanto aos judeus como aos gentios" (Confissão de Fé de Westminster Capítulo VII, Seção VI; Catecismo Maior de Westminster pergunta 35). A justificação de Deus é "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem; porque não há distinção" entre judeus e gentios (Rm 3.22; Confissão de Fé Capítulo VII, Seção VI). De fato, a justificação dos crentes, tanto sob o Antigo Testamento quanto sob o Novo Testamento, é, em todos os aspectos, "uma e a mesma" (Confissão de Fé Capítulo XI, Seção VI).

✔ Inclusão de Judeus na Igreja Universal: As orações na Oração Dominical incluem o pedido para que o evangelho seja propagado por todo o mundo, os "judeus, chamados, e que a plenitude dos gentios seja trazida à Igreja" (Catecismo Maior de Westminster, pergunta 191). Isso indica que o plano de Deus para Israel, como povo, é que eles sejam chamados e integrados na mesma Igreja que inclui os gentios. A Igreja invisível é definida como "o número completo dos eleitos que foram e que serão reunidos em um corpo sob Cristo, o Cabeça" (Catecismo Maior de Westminster, pergunta 64), reforçando a ideia de uma unidade futura do povo de Deus sob Cristo.

Portanto...

Os Símbolos de Fé de Westminster não defendem que a nação de Israel ainda possua um propósito específico, à parte da Igreja, no sentido de uma missão ou função nacionalmente distinta. Pelo contrário, eles indicam que o propósito de Deus é que os judeus, assim como os gentios, sejam chamados eficazmente e se unam à Igreja de Cristo, formando um único "povo de Deus" universal (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXV, Seção II; Catecismo Maior de Westminster pergunta 191).

Os Símbolos de Westminster afirmam que Israel foi a nação escolhida por Deus para revelar sua lei e salvação, sendo o "antigo povo de Deus". No entanto, com a Nova Aliança em Jesus Cristo, o conceito de "povo de Deus" universalizou-se e expandiu-se para incluir crentes de todas as nações, formando a Igreja. Essa expansão não anula a eleição histórica de Israel, mas demonstra a plenitude do plano de Deus para justificar e chamar a si pessoas de toda a humanidade "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem".

19 dezembro 2024

A esquerda e os riscos à Igreja

A esquerda apresenta riscos significativos à igreja e à Bíblia, manifestando-se em várias formas que desafiam os fundamentos da fé cristã. Um dos principais riscos reside na filosofia coletivista da esquerda, que ignora a natureza individual dos seres humanos. Essa visão pode levar a uma subordinação do indivíduo à vontade do Estado, o que é contrário aos princípios de liberdade individual e responsabilidade pessoal que são centrais ao cristianismo.

Além disso, a esquerda moderna, segundo o Dr. Lyle H. Rossiter em seu livro "A Mente Esquerdista", muitas vezes rejeita a competência e a soberania do indivíduo comum, favorecendo a autoridade de elites esquerdistas. Isso se reflete em uma expansão das funções do governo, resultando em leis opressivas e na rendição das liberdades pessoais. Essa tendência coletivista pode corroer o caráter dos indivíduos ao retirá-los de suas responsabilidades e obrigações, levando a uma dependência do governo que é incompatível com a autonomia e a iniciativa defendidas pela fé cristã.

Um dos maiores desafios para a igreja é a negação do pecado por parte do cristianismo progressista, que é uma corrente dentro da esquerda. Essa abordagem separa o que a Bíblia uniu, enfatizando o comportamento gracioso em detrimento da crença na verdade. Ao rejeitar o ensino bíblico sobre o pecado, essa visão também rejeita a necessidade da obra salvífica de Cristo, interpretando a morte de Jesus como algo diferente do pagamento pelos pecados da humanidade.

Outro risco significativo é a ênfase da esquerda na moralidade em detrimento da doutrina. Para a esquerda, o mais importante é como nos comportamos, e não o que cremos. Essa visão pode levar a uma relativização da verdade e a uma desvalorização da teologia, que é essencial para o entendimento e a prática da fé cristã. A esquerda muitas vezes critica a igreja por se preocupar excessivamente com a ortodoxia, confundindo essa preocupação com legalismo e hipocrisia.

A esquerda também apresenta uma visão simplista da fé cristã, retratando-a como uma "jornada" espiritual individual em vez de uma mensagem de salvação revelada por Deus. Isso leva a uma desvalorização da unidade do grupo em prol da busca pessoal, e a uma relativização da verdade, onde nenhuma certeza pode ser afirmada. A esquerda critica a igreja por sufocar o pensamento livre e por não aceitar questionamentos, quando, na verdade, o que a incomoda é a afirmação da igreja de que existem respostas para esses questionamentos.

Outro ponto crítico é a visão da esquerda sobre a igreja, que é vista como uma instituição falha e dispensável, com foco apenas horizontal (relações humanas), negligenciando o propósito vertical da igreja (relação com Deus). Para a esquerda, a igreja deve resolver problemas sociais, mas não priorizar a adoração e a proclamação da palavra de Deus.

Além disso, a esquerda muitas vezes considera a paz como mais importante que o poder, levando a uma abordagem excessivamente igualitária e pacifista que pode comprometer a autoridade da igreja e sua capacidade de defender a verdade. Martinho Lutero já afirmou: "A paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço". A esquerda também tende a justificar comportamentos pecaminosos com base em dificuldades e sofrimentos, relativizando os mandamentos de Deus.

Os desafios que a igreja precisa lutar incluem:

● Defender a verdade bíblica: A igreja deve permanecer firme no ensino da Bíblia sobre o pecado, a salvação em Cristo e a importância da doutrina.

● Promover a responsabilidade pessoal: A igreja deve ensinar a importância da autonomia e da responsabilidade pessoal, evitando a dependência do governo e a relativização das obrigações.

● Valorizar a teologia: A igreja deve defender o valor da teologia como essencial para o entendimento da fé cristã e refutar a ideia de que o comportamento é mais importante do que a crença.

● Proteger a unidade da igreja: A igreja deve promover a unidade do grupo e não a individualidade excessiva, reconhecendo que a verdade revelada por Deus é o fundamento da fé.

● Afirmar o propósito da igreja: A igreja deve reafirmar seu propósito vertical de glorificar a Deus e proclamar sua palavra, além de seu papel horizontal de servir ao próximo.

● Exercer autoridade bíblica: A igreja deve exercer sua autoridade para defender a verdade e condenar o erro, sem ceder a visões igualitárias que enfraquecem sua capacidade de guiar e proteger o rebanho.

● Combater a relativização moral: A igreja deve desafiar a ideia de que dificuldades justificam o pecado, e reafirmar os padrões morais estabelecidos por Deus.

A igreja deve estar vigilante e discernir os riscos que a esquerda apresenta, buscando permanecer fiel à Bíblia e aos seus princípios. A luta contra os desafios apresentados pela esquerda é crucial para a preservação da fé cristã e a integridade da igreja.


11 dezembro 2024

A Importância da Membresia na Igreja

Um Compromisso Bíblico e Transformador 

A membresia em uma igreja local é um elemento central na vivência plena da fé cristã, transcendendo a simples formalidade para estabelecer-se como um pilar fundamental na caminhada espiritual. Ao longo das Escrituras, percebe-se que a membresia não é uma escolha opcional, mas sim um imperativo divino, essencial para aqueles que desejam viver de acordo com os desígnios de Deus.

Primeiramente, a membresia na igreja representa um pacto solene entre o cristão e a comunidade de fé à qual ele pertence. Este compromisso vai além da frequência a cultos ou reuniões; implica submissão à autoridade eclesiástica, responsabilidades mútuas com os irmãos na fé e uma aliança pública de fidelidade a Cristo. A exortação de Hebreus 10:25 reforça a importância de não abandonar a congregação, evidenciando que a membresia não é uma prática opcional, mas uma expressão concreta de obediência à Palavra de Deus.

Além disso, a membresia é um testemunho público de identificação com Cristo e Sua Igreja. Em Mateus 16:18, Jesus afirma que edificará Sua igreja, declarando que nem mesmo as portas do inferno prevalecerão contra ela. Assim, rejeitar ou negligenciar a membresia é, em certo sentido, questionar a sabedoria divina e distanciar-se da estrutura estabelecida por Cristo para sustentar e guiar Seu povo.

Historicamente, a igreja local sempre desempenhou um papel crucial na formação e no crescimento espiritual dos cristãos. O livro de Atos dos Apóstolos apresenta a vida cristã como indissociável da vida em comunidade. A interdependência entre os membros é um tema recorrente, e a membresia oferece uma estrutura para que os dons espirituais sejam exercidos, promovendo edificação mútua. Observe:

  • Em Atos 2:42-47 descreve a dedicação da igreja primitiva ao ensino dos apóstolos, à comunhão, ao partir do pão e às orações. Os versículos 44-45 destacam como os membros compartilhavam tudo o que tinham, provendo uns aos outros conforme a necessidade, ilustrando a interdependência e a edificação mútua: "Todos os que criam estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade".
  • Em Atos 4:32-35 novamente vemos a união e a generosidade da igreja primitiva, que agiam como uma só família. Esse texto enfatiza a solidariedade e o apoio mútuo entre os membros: "Da multidão dos que creram, era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente sua nenhuma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum".
  • Em Atos 6:1-7 há o relato que destaca como a igreja local organizava sua comunidade para atender às necessidades específicas de seus membros, como a distribuição de alimentos às viúvas. Esse episódio também demonstra o exercício dos dons espirituais e a colaboração entre os membros para edificar a comunidade: "Escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, e mais seis outros. [...] E a palavra de Deus crescia, e o número dos discípulos se multiplicava grandemente em Jerusalém".
  • Em Atos 11:19-26 vemos como a igreja em Antioquia exemplificava a vida comunitária promovendo o crescimento espiritual e a evangelização. O trabalho conjunto de Barnabé e Paulo edificou a comunidade, resultando no primeiro uso do termo "cristãos": "E aconteceu que, por todo um ano, se reuniram naquela igreja e ensinaram numerosa multidão; em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos".
  • Em Atos 20:28, Paulo exorta os presbíteros da igreja em Éfeso a cuidarem do rebanho, destacando o papel da liderança espiritual em preservar e fortalecer a comunidade: "Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo os colocou como bispos, para pastorearem a igreja de Deus, que ele comprou com o seu próprio sangue".
  • E também vemos em Gálatas 6:10, Paulo destacando a responsabilidade de fazer o bem, "especialmente àqueles que pertencem à família da fé", evidenciando o compromisso coletivo que caracteriza a vida cristã.
Ademais, a membresia estabelece responsabilidades claras e privilégios para os crentes. Entre essas responsabilidades estão: a submissão à liderança espiritual, a participação ativa no discipulado mútuo, o envolvimento em ações de evangelização e o apoio ao ministério da igreja. Paralelamente, a membresia proporciona um ambiente seguro para a disciplina eclesiástica, visando restaurar aqueles que caem em pecado e proteger a pureza da comunidade, conforme descrito em Mateus 18 e 1 Coríntios 5.

Outro aspecto essencial da membresia é a demonstração de uma fé genuína por meio de uma vida transformada. Como ensina Mateus 3:8, "frutos dignos de arrependimento" são a evidência de uma conversão verdadeira. A igreja tem o papel de avaliar essa profissão de fé, garantindo que seus membros vivam de acordo com os princípios bíblicos. Dessa forma, a santidade visível torna-se um pré-requisito para a membresia, contribuindo para a preservação do testemunho cristão no mundo.

Embora os aspectos estruturais da membresia possam variar entre culturas e contextos, o princípio bíblico permanece imutável: a membresia deve refletir um compromisso sério com a fé, a submissão à liderança eclesiástica e o amor pelo corpo de Cristo. Processos como entrevistas, aulas de preparação e listas de membros são adaptações culturais, mas todos visam cumprir os objetivos de discipulado, supervisão espiritual e preservação da pureza da igreja.

Em conclusão, a membresia na igreja local não é meramente um aspecto organizacional, mas uma expressão prática de compromisso com Cristo, submissão à Sua Palavra e amor ao Seu povo. Ela é essencial para o crescimento espiritual, o serviço mútuo e a proclamação do evangelho. Portanto, valorizar e aderir à membresia é um testemunho de obediência e fidelidade ao propósito divino para a igreja, promovendo o fortalecimento da fé individual e coletiva.


11 novembro 2024

Confessionalismo e uma Igreja Florescente

Algumas pessoas estão inclinadas a pensar que o confessionalismo tem um efeito sufocante na igreja. Elas presumem que a adesão a credos e confissões baseados na Bíblia inibe a vitalidade ou a liberdade. Para elas, a igreja tem mais a ver com relacionamento e desconfiam de coisas mais formais e menos subjetivas. Outras, querem ser tão flexíveis e inclusivas quanto possível, para atrair a outros, e minimizam a doutrina. Esses preconceitos sobre o confessionalismo são válidos? Eles são consistentes com as Escrituras? É notável, de fato, a frequência com que o crescimento da fé está ligado ao crescimento pessoal e coletivo dos crentes nas Escrituras.

Adotar e usar uma confissão de fé bíblica não garante que a vida de uma congregação específica seja tão saudável quanto deveria ser. Será, no entanto, para proteger contra certas doenças espirituais que vêm do falso ensino. Em Efésios 4, o apóstolo Paulo nos diz que a igreja deve florescer por meio da verdade. Ela é destinada a ser edificada no amor, quando falamos a verdade em amor (Efésios 4:13 e 15). Devemos todos chegar “à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo”. Mas isso não pode acontecer se formos como meninos, “levados em roda por todo o vento de doutrina”. Ao “falar a verdade em amor” a igreja deve crescer “em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Efésios 4:14-15).

Quanto menos a verdade da Bíblia confessamos, menos vitalidade temos. Os cristãos devem resistir ao erro e manter a verdade e assim andar em Cristo, sendo arraigados, edificados e estabelecidos na fé (Colossenses 2:6-7). A Bíblia não é minimalista no modo como declara a verdade e nem nós deveríamos ser. Uma confissão completa de fé convida os cristãos a explorar e valorizar o panorama da verdade de Deus e tornarem-se maduros em seu entendimento. Uma confissão ajuda a igreja a cumprir sua comissão de fazer discípulos espiritualmente maduros (Mateus 28:20).

A Importância das Confissões

Deus nos deu a Sua Palavra para que tenhamos a informação que Ele quer que saibamos. Uma confissão de fé é colocarmos em nossas próprias palavras o que entendemos que Deus está dizendo em Sua Palavra. Algumas pessoas dizem que não têm credo, a não ser a Bíblia. Mas elas ainda têm sua própria interpretação do que a Bíblia ensina. Elas acreditam ou não acreditam na Trindade, por exemplo, ou na justificação somente pela fé. Elas simplesmente não escreveram suas crenças de forma sistemática. Elas têm um credo, só que não é um que está publicamente disponível.

Enquanto isso, todos os tipos de hereges podem citar a Bíblia. Então, se nos restringimos a usar apenas as palavras da Escritura, isso seria uma maneira inadequada de declarar a verdade. Quando alguém cita a Escritura, é sempre legítimo perguntar: “O que você quer dizer com isso?” Dizer: “Eu só acredito na Bíblia” não tem sentido, a menos que isso seja definido mais adiante. Quando uma igreja anota seu entendimento do que a Bíblia ensina, ela permite que qualquer um veja em que ela acredita, e também ajuda a igreja a alcançar clareza em sua missão de dizer ao mundo o que a Palavra de Deus diz. É por isso que Judas nos exorta a “batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Judas 3). Paulo encarregou Timóteo de manter firme o “modelo das sãs palavras” e de guardar “o bom depósito” (2 Timóteo 1:13-14).

Anthony Tuckney (1599-1670) desempenhou um papel fundamental na formação da Confissão de Fé de Westminster. Ele usa essas palavras de 2 Timóteo 1:13 para explicar o valor das confissões. Ele define confissões como uma forma de estabelecer a verdade de Deus de uma maneira ordenada. Elas reúnem as verdades que estão espalhadas por toda a Escritura. Ele então explica alguns dos benefícios de uma confissão.

Confissões nos Ajudam a Crescer na Verdade

Modelos de sãs palavras têm sido usados como declarações, não apenas daquilo em que nós mesmos acreditamos, mas também daquilo que pensamos ser o que todos deveriam crer. Também desejamos e exigimos que todos aqueles com quem nos unimos na comunhão mais próxima da igreja devem professá-las ou pelo menos não contradizê-las abertamente. Foi assim com os apóstolos no que eles decidiram em Atos 15, e é com as igrejas e suas confissões até hoje; e assim poderá ser sempre. Quando surgem controvérsias, elas podem ser melhor compreendidas e resolvidas com a ajuda de tais confissões. Elas também podem ser um bom depósito (2 Timóteo 1:14) a ser dado à posteridade, como legados ou heranças da fé de seus antepassados.

Confissões nos Ajudam a Crescer em União

As confissões não são apenas emblemas de nossa comunhão na igreja cristã, mas também são de grande ajuda e podem favorecê-la. Por este meio, as divisões problemáticas podem ser evitadas e a paz da igreja melhor preservada. Este é um benefício quando todos professamos a mesma verdade, e todos dizemos “a mesma coisa” e somos “unidos em um mesmo pensamento e em um mesmo parecer” (1 Coríntios 1:10).

Confissões nos Ajudam a Crescer em Paz

O fracasso em se manter mais próximo de tais “modelos de sãs palavras” permitiu a cada um falar e escrever as fantasias vãs de seu próprio coração e espalhar as mais terríveis heresias e blasfêmias com impunidade. Isso nos despedaçou e nos dividiu. Que o Senhor em misericórdia cure rapidamente esses cortes e rupturas. Um meio especial para curar isso é manter firme o modelo de sãs palavras (2 Timóteo 1:13).

Confissões nos Ajudam a Crescer em Força

Os apóstolos formularam suas decisões para ajudar aqueles que eram fracos (Atos 15:24) e uma confissão faz isso também. As verdades espalhadas por toda a Escritura estão reunidas em uma sinopse para que possamos ver com mais clareza. Onde há coisas mais obscuramente expressas, elas são mais familiarmente apresentadas àqueles de entendimento mais fraco.

Confissões nos Ajudam a Crescer em Discernimento

Confissões ajudam a descobrir e repelir sedutores e subversores das almas do povo de Deus (Atos 15:24). A mesma cerca que mantém o cervo evita a fera voraz. Elas são uma cerca para a vinha e portanto são de muito bom uso na igreja. Alguns venenos dificilmente podem ser detectados no início, mas como a boca toma sua comida, as ovelhas do pasto de Cristo discernem, por um instinto divino, que alimento é saudável e aquele que é diferente disso. Não são apenas aqueles que têm seus sentidos exercitados para discernir o bem e o mal, até mesmo o bebê recém-nascido tem esse paladar. Tão logo é feito participante da natureza divina, pode dizer quando o leite sincero da Palavra é adulterado (embora talvez não de que maneira). Um cristão piedoso (que tem um coração melhor do que a cabeça) já teve seu espírito se levantando contra algo que ele ouviu em um sermão, mas ele não podia dizer por quê. Depois foi-lhe mostrado que era uma doutrina muito corrupta.

Confissões nos Ajudam a Crescer em Saúde

Um modelo de sãs palavras é especialmente aquele pelo qual eles se recuperam e ganham saúde e força e assim prosperam. O bebê recém-nascido engorda e cresce pelo leite sincero da Palavra (1 Pedro 2:2). É um solo ruim aquele em que as plantas boas estão famintas ou doentes. É provável que seja uma dieta saudável se os homens (de outra forma bem e com saúde) não prosperam nela? Uma boa árvore (nosso Salvador nos diz) produz bons frutos e o mesmo pode ser dito da boa doutrina. Embora, pela corrupção dos corações dos homens, a boa doutrina nem sempre produza bons frutos em suas vidas, ainda que a má doutrina produza naturalmente o que é mau e abominável. Mas vamos continuamente estimar a comida espiritual saudável. O homem de Deus vive e prospera com isso e faz a vontade de Deus com alegria. Como Elias (que passou quarenta dias e quarenta noites na força do que ele comeu), o cristão continua na força desse alimento através do deserto deste mundo até chegar ao monte de Deus. Um coração sadio se deleita e prospera pela sã doutrina. Uma vez que o homem não vive só de pão, mas de toda Palavra que procede da boca de Deus, não é suficiente que estas sãs palavras tenham a aprovação do homem. Elas devem ser não apenas palavras aceitáveis, mas baseadas no que Deus instituiu, elas devem ser palavras da verdade, palavras sábias dadas pelo único Pastor.

Conclusão

Assim, certifique-se de conservar o “modelo das sãs palavras” (2 Timóteo 1:13). Como Cristo disse à igreja de Tiatira: “mas o que tendes, retende-o até que eu venha” (Apocalipse 2:25). Certifique-se de permanecer firme, tome cuidado para que você não seja roubado dele, mas tenha certeza que você o tem. Em várias passagens (Apocalipse 6:9 e Tito 1:9), manter-se firme significa que mantemos a verdade tão firmemente contra toda oposição que nenhuma força do homem ou do diabo pode forçá-la a se apartar de nós, mas que a guardamos firme contra todos.

A verdade é o bom depósito do céu (2 Timóteo 1:14) a qual Deus nos confiou. Nossas almas são o depósito (2 Timóteo 1:12) com o qual confiamos em Deus. Devemos ser tão cuidadosos com a Sua promessa quanto desejamos que ela seja nossa. Certifique-se de que seremos chamados para isso, e quão solene será se formos como o descrito em 1 Reis 20:39-40.

Este é o legado que nos foi dado pelos nossos piedosos antepassados, não deveríamos igualmente ter o cuidado de transmiti-lo à nossa posteridade (Salmos 78:3-4)? Os mártires o selaram com seu sangue, seremos culpados disso por nossa infidelidade? Esta é a melhor parte da herança de nossos filhos, como foi a lei (Deuteronômio 33:4). Certifique-se de que nossos antepassados não se envergonhem de nós e de nossa posteridade na ressurreição por trairmos a verdade de Deus e nossa fé. Manter-se firme é a ordem para muitas das igrejas descritas em Apocalipse 2 e 3, tanto as melhores quanto as piores. Manter-nos firmes pode nos levar a disputas, mas se formos fiéis no conflito, podemos ter certeza da conquista.


31 julho 2022

Para que filiar-se a uma igreja?

Por Mark Brown e Larry Wilson 

Alice estava lívida! Era a primeira vez que visitava aquela igreja, “e também a última”, pensou ela. A igreja tinha celebrado a Ceia do Senhor.

— Sou crente já faz quatro anos e o pastor teve o desplante de me mandar ficar de fora da comunhão! fumegou ela.
— Ele disse que quem estivesse com problemas com Deus ou com a Sua igreja que tratasse de resolvê-los antes de poder participar da mesa do Senhor, e me incluiu nisso somente porque não sou membro de igreja. Que ousadia!

Não é raro em nossos dias que crentes sinceros em Cristo, como Alice, pensem que filiar-se a uma igreja seja uma questão de opção. E, diante de tantas outras opções — livros, fitas de áudio e vídeo, programas de rádio e TV, recursos da Internet, grupos paraeclesiásticos etc. — filiar-se à igreja está lá no final da lista, se é que está na lista! Muitos jamais levaram em conta que o compromisso com uma congregação tenha lá toda essa importância, ou que seja assim tão agradável. Quase sempre ficam chocados quando ouvem que historicamente os cristãos consideram que seja essencial, e não opcional, filiar-se à igreja.

Seria arbitrária esta histórica convicção cristã? Seria legalista? O que é que a Bíblia tem a dizer sobre ser membro de uma igreja? Achamos que ela diz o suficiente. Portanto, considere conosco dez razões bíblicas pelas quais todo cristão declarado deve filiar-se a uma igreja local.

Filiar-se à igreja é ordem de Jesus

Em primeiro lugar, o nosso Senhor Jesus Cristo ordenou aos Seus seguidores que se filiassem à igreja. Em Mateus 16.18, Jesus diz aos Seus discípulos: “eu edificarei a minha igreja”. Ele descreve a igreja como o templo da nova aliança, e todos os que confessam que Jesus é o Senhor são as pedras desse edifício (Mt 16.16; 1Pe 2.5; Ef 2.19-20).

Em Mateus 28.19-20, Jesus confirma e amplia a sua declaração anterior ao ordenar aos Seus seguidores que façam discípulos, batizando-os e ensinando-os depois. O cumprimento dessa grande comissão resulta na inclusão dos convertidos à igreja. Por que dizemos isso? Porque a ordenança do batismo faz parte da grande comissão. Conquanto o batismo do Espírito Santo nos acrescente à igreja invisível (1Co 12.13), não devemos manter invisível a nossa salvação, temos que expressá-la externamente (Rm 10.9-10). O batismo de água, externo e visível, simboliza esta realidade invisível.

Atos 2.41 descreve como a igreja apostólica pôs esse princípio em prática: “Então, os que lhe aceitaram a palavra foram batizados, havendo um acréscimo naquele dia de quase três mil pessoas”. Houve um acréscimo a que? Atos 2.27 dá a resposta: “E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar”. Essa era a igreja visível, os apóstolos acompanhavam atentamente quem eram os batizados e até os contavam.

Cristo ordenou que fôssemos batizados. Ao ordenar que sejamos batizados, ordena-nos que também sejamos acrescentados à igreja. Noutras palavras, Ele ordena que nos filiemos à igreja, deseja que o nosso relacionamento com Ele seja honesto e perceptível (Mt 10.32) e que seja também um relacionamento corporativo (Hb 10.24-25).

O Velho Testamento ensina a filiação eclesiástica

Em segundo lugar o Velho Testamento ensina que os crentes devem se filiar à igreja. Os israelitas eram o povo da velha aliança de Deus. Deus ordenara a circuncisão como selo daquela relação pactual, e como sinal de membro da comunidade do pacto (Gn 17.7, 10-11). O Novo Testamento identifica essa velha comunidade da aliança como “a igreja” (At 7:38).

Se você fosse estrangeiro teria que ser circuncidado para se tornar membro de Israel antes de poder celebrar a Páscoa (Êx 12.43-44, 48). Noutras palavras, você teria que se “filiar à igreja” antes de poder participar da mesa do Senhor. Se não fosse circuncidado, não interessaria a sua história nem a sua fé subjetiva, você seria excomungado do meio do povo de Deus (Gn 17:14).

Pode ver o paralelismo com o Novo Testamento? O batismo é a circuncisão do Novo Testamento (Cl 2.11-12) e marca a sua entrada na nova comunidade do pacto, a igreja (Gl 3.27, 29; 6:15-16; Fp 3.3). A Ceia do Senhor é agora a nova Páscoa do pacto (cf. Mt 26.17-19; 1Co 5:7). Assim, da mesma maneira que era necessário ser circundado para se tornar membro de Israel antes de poder celebrar a Páscoa, do mesmo modo é necessário tornar-se membro da igreja antes de poder participar da Ceia do Senhor. Por isso é que, os que “foram batizados” e “acrescentados à igreja” eram os que participavam do partir do pão com os apóstolos (At 2.41-42; 47).

A filiação eclesiástica é inferência Neotestamentário

Terceira, o Novo Testamento pressupõe que todo convertido se filia à igreja. A conversão inclui ser acrescentado à igreja local visível (At 2.41, 47; 14:21-23). Era impensável que alguém pudesse abraçar a Cristo e optar depois por não se filiar à igreja do Senhor. Na verdade, quem não era membro da igreja era considerando como incrédulo (Mt 18.17). O cristianismo bíblico é intensamente pessoal, sempre, mas nunca particular e individualista.

O Novo Testamento enfatiza vigorosamente o caráter corporativo ou grupal do cristianismo. Ele fala do ajuntamento dos crentes como sendo, por exemplo, o corpo de Cristo, a noiva de Cristo, a família da fé, o templo do Espírito Santo, a comunhão dos santos, a nação santa, o povo de Deus, a família de Deus etc. Nos dias dos apóstolos, todo convertido filiava-se à igreja, senão o fizesse, não era considerado convertido.

A filiação eclesiástica é parte integrante da salvação

Quarta, o conceito bíblico de salvação envolve ser membro de igreja. Na Bíblia, vir a Cristo e à Sua igreja é uma coisa só, não duas. As pessoas hoje recebem a Cristo numa campanha de evangelização e só depois é que decidem se vão ou não se filiar a uma igreja. Algumas vezes nunca o fazem. A Palavra de Deus, no entanto, considera que vir a Cristo e filiar-se à Sua igreja são os dois lados de uma mesma coisa: assim como o lado de dentro e o lado de fora da salvação como um todo.

Internamente, você se volta para Deus e clama para que Ele lhe salve por meio do sangue e da justiça de Jesus Cristo.

Externamente, você se identifica como pertencendo a Cristo pela profissão da sua fé diante da igreja e na adoração, aprendizado e testemunho contínuos juntamente com a assembleia (Rm 10.9-10; Mt 10.32; At 2.41-42; Hb 10.25). Fazer parte de Cristo é, na Bíblia, fazer parte do corpo de Cristo (1Co 12.13, 27; Rm 12.5; Ef 5.29-30). Biblicamente, os cristãos servem a Cristo, não em isolamento autossuficiente, mas como membros vivos do Seu corpo.

A filiação eclesiástica patenteia a ordem eclesiástica

Quinta, as tantas prescrições bíblicas sobre ordem na igreja deixam claro que Deus espera que os crentes se filiem às igrejas locais. Deus estabelece requisitos de admissão (At 2.47), provê meios de expulsão da igreja (Mt 18.17; 1Co 5.4-5), ordena que haja líderes (ou oficiais) como pastores, presbíteros e diáconos (Ef 4.11-12; At 14.23; 1Tm 3.1-13). Só este último fato já evidencia que os crentes terão que se filiar à igreja. Pois, como é que haveria oficiais se não houvesse membros para os eleger e seguir? De onde é que viriam pastores, presbíteros e diáconos? Para que serviriam eles?

Em 1 Timóteo, depois de dar instruções sobre a oração no culto público (2.1-8), sobre as mulheres no culto público (2.9-15) e sobre a eleição de presbíteros e diáconos (3.1-13), o apóstolo Paulo explica: “para que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade” (3.15). Tais regras seriam inúteis, se os crentes não fossem membros de igrejas locais organizadas.

Muitos mandamentos bíblicos denotam filiação eclesiástica

Sexta, há muitas outras instruções bíblicas que só podem ser obedecidas se você for membro de igreja. Cristo instrui os Seus seguidores para que celebrem a Ceia do Senhor (Lc 22.19). Mas a Mesa do Senhor está posta apenas para os que são membros batizados de Sua igreja (veja abaixo a segunda razão).

Deus ordena que os cristãos amem a seus irmãos e os sirvam (Gl 6.2; 1Pe 3.17; 1Jo 3.14). Mas como é possível reconhecer os irmãos? Alguns se dizem crentes, e não o são. Como é que os crentes podem reconhecer a outros se não for pela identificação de pertencerem a uma igreja visível que prega o evangelho?

O que prevalece hoje é um espírito de autonomia que despreza a autoridade. Isso não é nada novo (2Pe 2.10). Mas Deus ordena aos Seus filhos redimidos que “acateis com apreço os que [...] vos presidem no Senhor e vos admoestam” (1Ts 5.12) e que “obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles” (Hb 13.17). Mas como será isso possível se você não se filiou à igreja que eles supervisionam? De que outra maneira seria possível saber quem são aqueles a quem Deus colocou sobre você?

Poderíamos dar muitos outros exemplos, mas esses devem bastar para mostrar que existem muitos outros mandamentos bíblicos que os crentes só podem obedecer se estiverem filiados à igreja. Destarte, recusar-se a se filiar à igreja de Jesus Cristo torna a pessoa culpa de inúmeros pecados de omissão, e de desobediência ao Senhor.

O cuidado pastoral exige filiação eclesiástica

A nossa sétima razão relaciona-se à sexta, mas achamos que será útil citá-la em separado. Seria impossível cuidar biblicamente da ovelha de Cristo sem a filiação à igreja. Deus ordena que os presbíteros pastoreiem o Seu rebanho no exercício do cuidado e da supervisão pastoral. A igreja é o rebanho que o Senhor deixou aos cuidados deles (At 20.28; 1Pe 5.1-4). Eles têm que concentrar a atenção naqueles que se filiaram à igreja sobre a qual Deus os fez supervisores (1Co 5.12). Os que visitam à igreja, porém, não estão sob a jurisdição dos presbíteros. Se não se filiarem a ela, como é que poderão ser pastoreados adequadamente? Além do mais, o bom pastor conhece as suas ovelhas pelos seus nomes e é também conhecido por elas (Jo 10.3-4, 14). Os que estão sob o seu pastorado não precisariam fazer o mesmo (1Pe 5.1-4)? Como poderão pastorear o rebanho se não souberem quem faz parte dele?

Em Mateus 18.15-18 o nosso Senhor Jesus ensina aos Seus discípulos como devem lidar com o pecado e o conflito no corpo de Cristo. Se um cristão professo está em pecado e nele persiste teimosamente sem se arrepender, a igreja deverá excomungá-lo e considerá-lo como um incrédulo (cf. 1Co 5). Se se arrepender deverá ser restaurado (2Co 2.5-11). O objetivo principal da disciplina é o socorro e a restauração (Gl 6.1). Mas como seria possível essa prática à igreja se não houvesse uma distinção objetiva entre os que são “de dentro” e os que são “de fora” (1Co 5.12-13)? É impossível obedecer às instruções de Cristo sobre a supervisão pastoral e a disciplina eclesiástica se os crentes não se tornarem membros de igreja.

A vida prática da igreja abrange a filiação eclesiástica

Oitava, há muitas questões de ordem prática que a igreja não pode realizar bem sem a filiação eclesiástica objetiva. Deus ordena que “Tudo, porém, seja feito com decência e ordem” (1Co 14.40). As igrejas precisam levantar pastores, eleger presbíteros e diáconos, definir orçamentos, comprar propriedades, construir locais de reunião etc. São decisões importantes. Mas sem membros objetivamente definidos, como seria possível decidir de modo justo — “com decência e ordem” — quem tem ou não o privilégio de votar?

O evangelismo bíblico exige a filiação eclesiástica

Nona, é impossível o evangelismo bíblico sem a filiação eclesiástica. A maior parcela do evangelismo de hoje reforça o tomar decisões. Jesus, no entanto, nos ordena a fazer discípulos. O medidor bíblico do sucesso evangelístico não está marcando muitas decisões professadas, só está alistando pessoas nos privilégios e nas responsabilidades de seguir a Cristo. Biblicamente o evangelismo só estará completo quando os convertidos estiverem matriculados na escola de Cristo e abraçados ao seio da família visível dos crentes (Mt 28.19-20; cf. 1Co 12:13; At 2.41, 47).

O amor de Deus clama pela filiação eclesiástica

Décima e última, o grande amor de Deus pela igreja convida os crentes a que se filiem à igreja. A Bíblia reforça repetidamente o quão vital e importante é a igreja para o Deus vivo e Trino.

A igreja estava no coração de Deus na Sua obra de criação (Ef 3.9-11). A igreja estava no coração de Deus, na Sua obra de salvação (Mt 16.18; Ef 5.25). A igreja tem a promessa da Sua presença especial (Hb 2.12; Mt 18.20). Se a igreja é tão importante para o Senhor, também não deveria ser para todos aqueles que O amam? Como é que você pode amar ao Senhor e ao mesmo tempo se desviar para longe daquilo que o Senhor ama? Será que isso não quer dizer que todo o crente tem que se identificar abertamente com a igreja de Cristo?




28 outubro 2020

Falsos Mestres, um “Câncer” Dentro da Igreja

Por Vilmar Rodrigues Nascimento 

Zelo espiritual é uma qualidade indispensável ao verdadeiro pregador da Palavra de Deus. No entanto, esse mesmo zelo tem sido usado por falsos mestres moralistas e farisaicos com fins espúrios. É por isso que os falsos líderes são tão amados e admirados. Eles exercem suas funções eclesiásticas levantando a bandeira do zelo pelas coisas sagradas, quando na verdade, são lobos vorazes em pele de cordeiros. 

A história bíblica, eclesiástica e teológica é prova contundente que muitos hereges foram grandemente estimados por suas pregações e ensinos moralistas. Louis Berkhof escreveu sobre o herege Márcion nestes termos:

“Homem de zelo profundo e de grande habilidade, que labutava no espírito de um reformador. A princípio procurou sujeitar a Igreja à sua maneira de pensar, mas não conseguindo êxito em sua obra reformista, sentiu–se constrangido a organizar seus seguidores numa Igreja separada, buscando aceitação universal para seus pontos de vista através de ativa propaganda” (A História das Doutrinas Cristãs. Editora: PES. Pg. 49).


Márcion ensinava uma distinção absoluta entre o Antigo Testamento e o Novo Testamento. Para ele, o Deus do AT não era o mesmo do NT. Entendia a matéria como má, portanto, negava a encarnação de Cristo. O apóstolo João em sua primeira Carta à Igreja escreveu alertando tal fenômeno:

“Filhinhos, é já a última hora; e, como ouvistes que vem o anticristo, também agora muitos se têm feitos anticristos, por onde conhecemos que é já a última hora. Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós” (1 Jo 2.18, 19).


Muitos blasfemadores saíram da Igreja ao serem confrontados e combatidos pelos apologetas. Outros, porém, ficaram disseminando seus erros doutrinários travestidos de zelo espiritual. Os falsos líderes eram e continuam sendo amados porque seus ensinos culminam em práticas pecaminosas que se adéquam ao gosto e interesses de seus ávidos ouvintes. Nesse contexto, como “serpentes”, os falsos mestres continuam tentando muitos membros da Igreja, que atraídos pelos seus discursos arrebatadores são seduzidos e atacados com “veneno” mortal: a heresia.

Todos os falsos mestres receberão no porvir o justo juízo de Deus e Sua implacável ira, castigando-os eternamente em todos os seus pecados.

Nos dias atuais os falsos líderes continuam sendo amados e admirados, mas com uma grande diferença: a mídia. Os holofotes em torno deles têm potencializado não só o amor e admiração, mas terrivelmente a veneração e idolatria de seus seguidores. Qual o principal fundamento para tanto "sucesso"? O amor e o prazer ao pecado travestido de falsa piedade, zelo e moralismo. Acontece assim: Os falsos líderes injetam “veneno” através dos falsos ensinos em seus seguidores e seus seguidores tornam-se um com eles e, ao mesmo tempo, dependentes deles, ao ponto de precisarem de mais “veneno” e mais “veneno”... O resultado é mais amor ao pecado e mais prazer em pecar. Esse ciclo é mortal. O “veneno” injetado mata. Os sintomas do “câncer” são bem vistos no estilo de vida dos falsos mestres e seus seguidores, eles são: egocêntricos e excêntricos. Idólatras e oportunistas. Avarentos e mundanos. Hedonistas e narcisistas. Tornam-se consumidores insaciáveis. É por isso que Paulo ao exortar os jovens pastores Timóteo e Tito, disse enfaticamente:

“É preciso fazê-los calar, porque andam pervertendo casas inteiras, ensinando o que não devem, por torpe ganância” (Tt 1.11). “Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocações, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro” (1 Tm 6.3–5).

Em 1 Tm 1.3–7 o apóstolo Paulo exorta e orienta Timóteo bem como a igreja em Éfeso sobre o dano que os falsos mestres podem fazer ao povo de Deus e a causa de Cristo. No verso 7 está escrito: “Pretendendo passar por mestres da lei, não compreendendo, todavia, nem o que dizem, nem os assuntos sobre os quais fazem ousadas asseverações”. O verbo “pretender” no original grego significa: Querer, ter em mente, desejar muito, estar resolvido. O modo verbal particípio presente deixa claro a ação de continuidade. A voz no original é ativa. Portando, os falsos mestres amam continuamente o que fazem e não abrirão mão por ativamente amarem serem o que são – falsos mestres. O restante do versículo e capítulo é uma conclusão lógica à luz do contexto de toda carta do que são capazes e estão dispostos a fazer.

É importante frisar que Paulo ensina Timóteo e a igreja, que os falsos mestres agem abertamente como se fossem verdadeiros “mestres da lei”. Contudo, eles não sabem “nem o que dizem”, que dirá “os assuntos sobre os quais fazem ousadas asseverações”. O verbo “passar” no original significa: Ser, existir, acontecer. Ele está expressando uma ação contínua e ativa. Conclui-se que os falsos mestres jamais abrirão mão de ensinarem por amarem o que fazem. Eles continuarão ativamente dentro da igreja disseminando implacavelmente seus falsos ensinos e para melhor resultado, passam-se por “mestres da lei”. Ou seja, tais hereges existem e acontecem falsamente no meio protestante como “mestres da lei”. Que “câncer!” Que lástima! Que tragédia!

Paulo deixa claro à igreja que os falsos mestres “fazem ousadas asseverações”. Eis aqui uma forma clássica de ação: Eles são firmes em seus discursos e enfáticos no método de impressão de seus ensinos através de uma impressionante impostação vocálica. Eles almejavam o púlpito sagrado. Amam pregar. O verbo “asseverar” no original significa: Afirmar com ênfase, declarar de forma contundente. Seu sentido no texto é colocado por Paulo como uma certeza contínua. Portanto, os falsos mestres sempre usarão a oratória como método e recurso para atingir seus objetivos. E mais: Paulo usa a voz média no original, significando que eles sempre estarão preocupados com seus próprios interesses: O amor, prazer e entrega ao pecado.

Muitos falsos mestres existiam dentro da igreja em Éfeso. Mas Paulo faz questão imediata de citar dois nominalmente: “Himeneu e Alexandre” (1 Tm 1.20). O apóstolo antes de fazer menção dos nomes, usa o verbo no original “rejeitar” no verso 19: “tendo eles rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé”. Esse verbo significa: Expulsar para fora de si mesmo, repulsar. É um particípio no aoristo. O aoristo expressa uma ação realiza e acabada. O sentido fica assim: “Alexandre e Himeneu tendo uma vez rejeitado definitivamente a boa consciência, vieram a naufragar na fé”. A voz média é usada para expressar que o sujeito age em benefício próprio. Significando que os dois tomaram tal decisão visando seus próprios interesses. A convicção de Paulo foi clara e objetiva: “os entreguei a Satanás”. Qual propósito? “para serem castigados, a fim de não mais blasfemarem” (v.20).

A igreja em Éfeso não poderia mais se deixar doutrinar e influenciar pelos falsos mestres. Paulo consciente desta realidade exorta Timóteo bem como a igreja:

“Este é o dever que te encarrego, ó filho Timóteo, segundo as profecias de que antecipadamente foste objeto: combate, firmado nelas, o bom combate, mantendo fé e boa consciência, porquanto alguns tendo rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé” (vv.18, 20).


É importante ressaltar que Paulo imediatamente no verso 20 cita Himeneu e Alexandre. Por quê? O próprio contexto da carta deixa claro que esses falsos líderes e sua corja não estavam preocupados com o parecer paulino sobre eles. Eles estavam interessados em disseminar suas heresias a fim de darem vazão aos seus desejos carnais e egoístas. Paulo destaca bem tal motivação aos fiéis no capítulo 6.3–10. No verso 5 está escrito: “... homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro”. Aqui há uma grande lição para a igreja em todos os tempos no que concerne à prevenção e combate aos falsos líderes. Paulo faz uma afirmação categórica: os falsos mestres são contínuos em seus objetivos. Portanto, não cabe aos líderes e à igreja serem flexíveis com eles. Eles devem ser implacavelmente combatidos. Por isso que o apóstolo Paulo em nome da saúde da igreja e da glória de Cristo não hesitou em citar nomes. Aqui não houve espaço para o hasteamento da tão famosa bandeira hodierna do politicamente correto! Paulo usou o verbo “supor” que no original significa: manter pelo costume ou uso, considerar. O modo verbal é o genitivo, indicando posse. O tempo verbal expressando continuidade e a voz indicando ação do sujeito. 

Para os primeiros leitores ficou clara a mensagem. Ou seja, os falsos mestres estavam viciados no uso contínuo e ativo da fé religiosa como fonte de lucro. Estavam exercendo grande influência sobre as casas e em especial as mulheres (5.1–16). Agindo assim, perpetuavam sua influência e poder dentro da igreja. Eles almejavam tomar posse completa do púlpito – que é a expressão máxima da verdadeira pregação Cristocêntrica – e o transformar em sua mais elevada tribuna pervertendo–o para os seus mais espúrios e avarentos propósitos. O “câncer” mortal do falso ensino estava se espalhando dentro da igreja em Éfeso (2 Tm 2.17,18). É neste contexto que devemos analisar e entender o famoso versículo: “porque o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males; e alguns, nesta cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram com muitas dores” (v.10).

Os falsos mestres de hoje são bem parecidos com os de ontem. Seus erros e práticas são mais visíveis por força da velocidade da informação e propaganda. Os pecados são os mesmos. Os objetivos são os mesmos. Eles amam e se deleitam no prazer do pecado. Precisam custear seus mais exóticos, estapafúrdios e caros desejos carnais. Como? Eles se infiltram na igreja a fim de usá-la para fins gananciosos. Eles nunca saíram por completo de nosso meio. Deus os mantém dentro de seu soberano, sapiente e eterno plano. Naquele grande dia tudo será revelado. Inclusive alguns mistérios que giram em torno dos falsos mestres em sua constante permanência no seio da igreja eleita: “O Senhor conhece os que lhe pertencem” (2 Tm 2.19). Confiemos. Descansemos. Porém, não nos acovardemos. Paulo nesta particularidade é implacável para com seu pupilo na fé, Timóteo:

“Tem cuidado de ti mesmo e da sã doutrina. Continua nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes”. “Tu, porém, ó homem de Deus, foge destas coisas; antes, segue a justiça, a piedade, a fé, o amor, a mansidão” (1 Tm 4.16; 6.11).


Timóteo, além do cuidado pessoal, tinha que velar pela sã doutrina, bem como fugir da avareza ao mesmo tempo em que deveria levar a igreja à constante vigilância tendo como alvo a vida eterna, a pátria celestial. A igreja atual tem sofrido constantemente com os falsos mestres moralistas travestidos de uma falsa piedade e zelo espiritual. Não é por falta de advertência bíblica. Paulo alertou contundentemente a igreja em Filipos. No capítulo 3.2, os falsos mestres são chamados de “cães”. Eles estão dentro da igreja que pertence ao Senhor Jesus Cristo. Eles são indomesticáveis. Organizam-se em matilhas. São impuros, egocêntricos, avarentos, idólatras, carnais, moralistas e hipócritas (Fl 3.1–21). Eles precisam ser urgentemente amordaçados (Tt 1.11).

Então por que a igreja atual tem demasiadamente tolerado tais mestres em seu meio e púlpito? Por que a liderança tem sido em geral indiferente há tão grande lástima? Certamente, o mundanismo que tem permeado todas as áreas da igreja é um agente potencializador e, em muito tem cooperado para tal quadro decadente. Contudo, não minimizemos os desejos mais espúrios e carnais dos falsos mestres e dos seus admiradores que têm se alimentado de seus erros e práticas antibíblicas. Tragicamente, os “Himeneu(s) e Alexandre(s)”, têm sido mais ouvidos do que os “Timóteo(s)” e “Tito(s)”. Quem são midiáticos? Quem são propagandistas? Quem alimenta o ego e a carne? Quem ama o ovacionismo? Quem alimenta o sistema religioso institucionalizado mercantilista? Quem ama desesperadamente o dinheiro? A resposta é muito simples – Os falsos mestres e seus seguidores, a igreja “mundanizada” e escravizada pela mídia mercantilista.

Que faremos então? Oremos, preguemos e paguemos o preço em prol do verdadeiro evangelho, o antigo, mas sempre atual evangelho da graça de Cristo, que nunca foi contrário à propagação do reino nos quadrantes do mundo. Ocupemos então, os meios de comunicação de forma bíblica e piedosa a fim de proclamarmos a salvação em Cristo, mas também, o juízo de Deus contra todos àqueles que não passam de verdadeiros aproveitadores.

Soli Deo Gloria. Amém!

Fonte: Bereianos