ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER
Capítulo XX. Da Liberdade Cristã e Da Liberdade de Consciência
Seção I. A liberdade que Cristo, sob o Evangelho, comprou para os crentes consiste em serem eles libertos da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus, da maldição da lei moral; em serem libertos do poder deste mundo, do cativeiro de Satanás, do domínio do pecado, da nocividade das aflições, do aguilhão da morte, da vitória da sepultura e da condenação eterna; como também em terem eles livre acesso a Deus, em lhe prestarem obediência, não movidos de um medo servil, mas de amor filial e de espírito voluntário. Todos estes privilégios eram comuns também aos crentes sob a lei; mas, sob o Novo Testamento, a liberdade dos cristãos está mais ampliada, achando-se eles livres do jugo da lei cerimonial a que estava sujeita a Igreja judaica e tendo mais ousadia no acesso ao trono da graça e mais plenas comunicações do gracioso Espírito de Deus do que ordinariamente alcançavam os crentes sob a lei.
Introdução
A doutrina da liberdade cristã é uma das verdades mais profundas e transformadoras do Evangelho, revelando a extensão da obra redentora de Jesus Cristo na vida dos crentes. Mais do que simplesmente a ausência de impedimentos externos, essa liberdade possui múltiplas dimensões, incluindo uma profunda libertação do domínio do pecado, da condenação divina, do poder das trevas e do jugo da lei, conduzindo a um relacionamento filial com Deus e a uma obediência motivada pelo amor. Este estudo busca aprofundar-se nos diversos aspectos dessa liberdade, descrevendo os privilégios comuns a todos os crentes em ambas as dispensações — Antigo e Novo Testamento — e enfatizando as formas pelas quais a liberdade cristã se manifesta de maneira mais plena e ampliada sob a Nova Aliança.
1) Libertação Abrangente da Culpa, Ira e Maldição da Lei Moral
A liberdade que Cristo conquistou para os crentes no Evangelho consiste primariamente em serem libertos da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus e da maldição da lei moral (Tito 2.14; 1 Tessalonicenses 1.10; Gálatas 3.13). A Escritura afirma que Deus manifesta Sua ira contra os pecados (Romanos 1.18; Gálatas 3.10; Efésios 2.3) e que, como pecadores, somos por natureza objetos dessa ira (Romanos 5.10; 11.28). A lei moral, que é a expressão da natureza santa de Deus, é santa, justa e boa (Romanos 7.12), e exige perfeita obediência. No entanto, por causa do pecado, essa lei tornou-se impotente para justificar (Romanos 3.20), agravando o pecado e provocando ira, juízo e morte (Romanos 4.15; 5.20; 7.5, 8-9,13; 2 Coríntios 3.6ss.; Gálatas 3.10,13,19). Todos os seres humanos, judeus e gentios, estão debaixo do pecado (Romanos 3.9,23) e destituídos da glória de Deus.
Cristo, no entanto, veio para cumprir toda a justiça da lei (Mateus 3.15). Ele nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição em nosso lugar (Gálatas 3.13). Sua obediência perfeita e Seu sacrifício carregaram nossa culpa e suportaram todas as punições. Pela Sua morte, Ele purificou nossos pecados e pagou o preço para nossa libertação. A justificação, que é um ato legal e declaratório de Deus, perdoa os pecados e imputa a justiça de Cristo aos crentes. Sendo justificados pela fé, temos paz com Deus e acesso a Ele (Romanos 5.1-2). Isso significa que a ira de Deus é desviada e uma relação de paz é estabelecida entre Deus e os seres humanos (Romanos 5.9-10).
2) A Libertação do Poder do Pecado, do Mundo e de Satanás
A liberdade cristã, além da culpa e da condenação, abrange a libertação do poder deste mundo, do cativeiro de Satanás e do domínio do pecado. O pecado é um poder que escraviza seus servos (João 8.34; Romanos 6.20), e só pode ser quebrado e vencido por Cristo (João 8.36; Romanos 8.2). A verdadeira liberdade consiste em não estar mais sujeito ao pecado, mas sim à graça.
Cristo nos livrou da escravidão ao pecado com Sua morte (Gálatas 1.4; Colossenses 1.13; Atos 26.18; Romanos 6.14). Por meio de Sua morte e ressurreição, Ele destruiu aquele que tinha o poder da morte, o Diabo, e libertou aqueles que pelo temor da morte estavam sujeitos à escravidão (Hebreus 2.14-15). Quando libertos do pecado, tornamo-nos servos da justiça (Romanos 6.18). Essa libertação do pecado não implica em licença para o pecado (Gálatas 5.13; 1 Pedro 2.16), mas em um compromisso com a retidão e a santidade. A santificação, que é o crescimento progressivo do crente em pensamentos, palavras e ações justas, é uma consequência necessária dessa libertação. A lei de Deus, embora não seja mais um método de salvação ou um sistema de penalização, permanece como o padrão da vida moral e uma transcrição da santidade de Deus, com validade permanente para o crente. O evangelho, que é a salvação concedida e recebida em Cristo, é o motivo poderoso para um modo de vida santo.
3) Triunfo sobre Aflições, a Morte e a Condenação Eterna
A liberdade cristã também se estende à libertação da nocividade das aflições, do aguilhão da morte, da vitória da sepultura e da condenação eterna (Romanos 8.28; Salmos 119.71; Romanos 8.1; 1 Coríntios 15.54-57). A morte e o inferno não têm mais domínio sobre o crente. Os sofrimentos que os cristãos suportam não são castigos vingativos pelo pecado, mas disciplina de um Pai que castiga aqueles que ama (Hebreus 12.5-6).
A ressurreição de Cristo assegura a vitória sobre a morte e a promessa da vida eterna. Embora a peregrinação terrena dos crentes termine na morte, eles entram em sua pátria celestial. A vida eterna é um dos benefícios centrais da nova aliança, adquirida pelo sangue de Cristo e manifestada de forma mais notável no Novo Testamento (2 Timóteo 1.10). A fé e a esperança cristãs capacitam os crentes a se elevarem acima das coisas temporais e sensoriais, vencendo o mundo e buscando as coisas celestiais. Os crentes são libertos de toda culpa do pecado e da condenação, e sua santificação é iniciada imediatamente, continuando ao longo da vida cristã até ser completada na volta de Cristo (Romanos 8.30; 2 Coríntios 3.18).
4) Livre Acesso a Deus e Obediência por Amor Filial
Um privilégio fundamental da liberdade cristã é o livre acesso a Deus (Romanos 5.1-2). Pela fé, os crentes são unidos a Cristo, recebendo Sua justiça e sendo introduzidos em um estado de favor divino, regozijando-se na esperança da glória de Deus (Romanos 5.1-3). Isso lhes permite aproximar-se de Deus com confiança, como filhos. Todo crente tem igual livre acesso a Deus por meio de Cristo.
A obediência cristã não é motivada pelo medo servil, mas por amor filial e um espírito voluntário (Romanos 8.14-15; 1 João 4.18). O Espírito de adoção, que os crentes recebem (Romanos 8.15), capacita-os a clamar "Aba, Pai" e a andar em conformidade com a vontade de Deus. A lei não é um fardo para os cristãos, mas um prazer (Salmos 1.2; 119.16, 24,97). O Espírito de Cristo submete e habilita a vontade do homem a fazer livre e alegremente o que a vontade de Deus, revelada na lei, requer (Ezequiel 36.27; Hebreus 8.10; Jeremias 31.33). A graça nos salva para "boas obras" (Efésios 2.8-10), e O evangelho é a grande razão para vivermos uma vida santa.
5) A Liberdade Ampliada no Novo Testamento
Embora os privilégios acima mencionados fossem comuns também aos crentes sob a lei (Gálatas 3.9,14), a liberdade dos cristãos no Novo Testamento está mais ampliada. Os crentes do Antigo Testamento, embora fossem filhos de Deus e tivessem direito à herança celestial, eram como "menores" sob a tutela da lei (Gálatas 4.1-2; 3.23-24).
I. Libertação do Jugo da Lei Cerimonial Sob o Novo Testamento. Os cristãos estão livres do jugo da lei cerimonial a que estava sujeita a Igreja judaica (Gálatas 4.1-3,6-7; 5.1; Atos 15.10-11). A lei cerimonial servia como um "pedagogo para nos conduzir a Cristo" (Gálatas 3.24) e como uma "parede divisória" entre judeus e gentios (Efésios 2.14), funções que foram abolidas em Cristo. As cerimônias da lei eram tipos e figuras do Cristo que haveria de vir (Hebreus 10.1), e as sombras se desvanecem quando a verdade se manifesta. O sacerdócio levítico e os sacrifícios, que eram propiciatórios pelos pecados, foram abolidos com a vinda do verdadeiro santuário em Cristo (Hebreus 9.1-10.18). Muitas coisas impostas aos judeus, como a abstenção de certas carnes e impurezas cerimoniais, não obrigam os cristãos (Atos 15.10-11; 1 Timóteo 4.4).
II. Mais Ousadia no Acesso ao Trono da Graça. A liberdade cristã no Novo Testamento se manifesta em ter mais ousadia no acesso ao trono da graça (Hebreus 4.14-16; 10.19-22). Enquanto os crentes do Antigo Testamento, embora filhos de Deus, eram como "menores", sujeitos a uma instrução rígida e ao temor do castigo, os crentes do Novo Testamento são "adultos e emancipados por Cristo", admitidos no santuário do Pai e com pleno senso de seu direito (Gálatas 4.4-5). Essa maior ousadia é resultado de Cristo ter aberto um novo e vivo caminho de acesso a Deus.
III. Mais Plenas Comunicações do Gracioso Espírito de Deus. O Novo Testamento se caracteriza por comunicações mais plenas do gracioso Espírito de Deus do que ordinariamente alcançavam os crentes sob a lei (João 7.38-39; 2 Coríntios 3.13,17-18). Embora o dom do Espírito estivesse incluído na promessa a Abraão e fosse prometido no Antigo Testamento (Isaías 44.3; Ezequiel 36.26-27), sua efusão foi peculiar ao Novo Testamento após a glória de Cristo (João 7.39). O Espírito Santo guia à toda a verdade (João 16.13), não por entusiasmo imediato, mas por meios ordenados como a pregação da Palavra (1 João 2.20; Romanos 12.2; Efésios 5.10; Filipenses 1.10). Essa maior medida do Espírito confere uma iluminação mais clara do intelecto e uma eficácia interna maior na santificação. O Espírito Santo é o Senhor e Doador da vida, e a fonte de todos os pensamentos bons, desejos puros e conselhos santos. Ele é o verdadeiro intérprete da palavra de Deus e habita no coração de cada crente.
Conclusão
A liberdade cristã, portanto, é um dom inestimável, integralmente adquirido pela obra redentora de Jesus Cristo, abrangendo a libertação da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus, da maldição da lei moral, do domínio do pecado e de Satanás, e da condenação eterna. Essa liberdade se manifesta em um acesso confiante e sem entraves a Deus, impulsionando os crentes a uma obediência que brota de um amor filial e de um espírito voluntário, em contraste com o medo servil. Embora os crentes do Antigo Testamento partilhassem de muitos desses privilégios, a Nova Aliança trouxe uma ampliação notável dessa liberdade, particularmente na libertação do jugo da lei cerimonial, na ousadia aprimorada no acesso ao trono da graça e nas comunicações mais plenas e efetivas do Espírito Santo. Essa liberdade não é uma licença para a impiedade, mas um fortalecimento divino para uma vida de santidade e gratidão (Efésios 2.10), glorificando a Deus em todas as esferas da existência.