27 julho 2025

Sobre a Liberdade Cristã

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, Recife/PE 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo XX. Da Liberdade Cristã e Da Liberdade de Consciência 

Seção I. A liberdade que Cristo, sob o Evangelho, comprou para os crentes consiste em serem eles libertos da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus, da maldição da lei moral; em serem libertos do poder deste mundo, do cativeiro de Satanás, do domínio do pecado, da nocividade das aflições, do aguilhão da morte, da vitória da sepultura e da condenação eterna; como também em terem eles livre acesso a Deus, em lhe prestarem obediência, não movidos de um medo servil, mas de amor filial e de espírito voluntário. Todos estes privilégios eram comuns também aos crentes sob a lei; mas, sob o Novo Testamento, a liberdade dos cristãos está mais ampliada, achando-se eles livres do jugo da lei cerimonial a que estava sujeita a Igreja judaica e tendo mais ousadia no acesso ao trono da graça e mais plenas comunicações do gracioso Espírito de Deus do que ordinariamente alcançavam os crentes sob a lei. 


Introdução

A doutrina da liberdade cristã é uma das verdades mais profundas e transformadoras do Evangelho, revelando a extensão da obra redentora de Jesus Cristo na vida dos crentes. Mais do que simplesmente a ausência de impedimentos externos, essa liberdade possui múltiplas dimensões, incluindo uma profunda libertação do domínio do pecado, da condenação divina, do poder das trevas e do jugo da lei, conduzindo a um relacionamento filial com Deus e a uma obediência motivada pelo amor. Este estudo busca aprofundar-se nos diversos aspectos dessa liberdade, descrevendo os privilégios comuns a todos os crentes em ambas as dispensações — Antigo e Novo Testamento — e enfatizando as formas pelas quais a liberdade cristã se manifesta de maneira mais plena e ampliada sob a Nova Aliança.

1) Libertação Abrangente da Culpa, Ira e Maldição da Lei Moral

A liberdade que Cristo conquistou para os crentes no Evangelho consiste primariamente em serem libertos da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus e da maldição da lei moral (Tito 2.14; 1 Tessalonicenses 1.10; Gálatas 3.13). A Escritura afirma que Deus manifesta Sua ira contra os pecados (Romanos 1.18; Gálatas 3.10; Efésios 2.3) e que, como pecadores, somos por natureza objetos dessa ira (Romanos 5.10; 11.28). A lei moral, que é a expressão da natureza santa de Deus, é santa, justa e boa (Romanos 7.12), e exige perfeita obediência. No entanto, por causa do pecado, essa lei tornou-se impotente para justificar (Romanos 3.20), agravando o pecado e provocando ira, juízo e morte (Romanos 4.15; 5.20; 7.5, 8-9,13; 2 Coríntios 3.6ss.; Gálatas 3.10,13,19). Todos os seres humanos, judeus e gentios, estão debaixo do pecado (Romanos 3.9,23) e destituídos da glória de Deus.

Cristo, no entanto, veio para cumprir toda a justiça da lei (Mateus 3.15). Ele nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição em nosso lugar (Gálatas 3.13). Sua obediência perfeita e Seu sacrifício carregaram nossa culpa e suportaram todas as punições. Pela Sua morte, Ele purificou nossos pecados e pagou o preço para nossa libertação. A justificação, que é um ato legal e declaratório de Deus, perdoa os pecados e imputa a justiça de Cristo aos crentes. Sendo justificados pela fé, temos paz com Deus e acesso a Ele (Romanos 5.1-2). Isso significa que a ira de Deus é desviada e uma relação de paz é estabelecida entre Deus e os seres humanos (Romanos 5.9-10).

2) A Libertação do Poder do Pecado, do Mundo e de Satanás

A liberdade cristã, além da culpa e da condenação, abrange a libertação do poder deste mundo, do cativeiro de Satanás e do domínio do pecado. O pecado é um poder que escraviza seus servos (João 8.34; Romanos 6.20), e só pode ser quebrado e vencido por Cristo (João 8.36; Romanos 8.2). A verdadeira liberdade consiste em não estar mais sujeito ao pecado, mas sim à graça.

Cristo nos livrou da escravidão ao pecado com Sua morte (Gálatas 1.4; Colossenses 1.13; Atos 26.18; Romanos 6.14). Por meio de Sua morte e ressurreição, Ele destruiu aquele que tinha o poder da morte, o Diabo, e libertou aqueles que pelo temor da morte estavam sujeitos à escravidão (Hebreus 2.14-15). Quando libertos do pecado, tornamo-nos servos da justiça (Romanos 6.18). Essa libertação do pecado não implica em licença para o pecado (Gálatas 5.13; 1 Pedro 2.16), mas em um compromisso com a retidão e a santidade. A santificação, que é o crescimento progressivo do crente em pensamentos, palavras e ações justas, é uma consequência necessária dessa libertação. A lei de Deus, embora não seja mais um método de salvação ou um sistema de penalização, permanece como o padrão da vida moral e uma transcrição da santidade de Deus, com validade permanente para o crente. O evangelho, que é a salvação concedida e recebida em Cristo, é o motivo poderoso para um modo de vida santo.

3) Triunfo sobre Aflições, a Morte e a Condenação Eterna

A liberdade cristã também se estende à libertação da nocividade das aflições, do aguilhão da morte, da vitória da sepultura e da condenação eterna (Romanos 8.28; Salmos 119.71; Romanos 8.1; 1 Coríntios 15.54-57). A morte e o inferno não têm mais domínio sobre o crente. Os sofrimentos que os cristãos suportam não são castigos vingativos pelo pecado, mas disciplina de um Pai que castiga aqueles que ama (Hebreus 12.5-6).

A ressurreição de Cristo assegura a vitória sobre a morte e a promessa da vida eterna. Embora a peregrinação terrena dos crentes termine na morte, eles entram em sua pátria celestial. A vida eterna é um dos benefícios centrais da nova aliança, adquirida pelo sangue de Cristo e manifestada de forma mais notável no Novo Testamento (2 Timóteo 1.10). A fé e a esperança cristãs capacitam os crentes a se elevarem acima das coisas temporais e sensoriais, vencendo o mundo e buscando as coisas celestiais. Os crentes são libertos de toda culpa do pecado e da condenação, e sua santificação é iniciada imediatamente, continuando ao longo da vida cristã até ser completada na volta de Cristo (Romanos 8.30; 2 Coríntios 3.18).

4) Livre Acesso a Deus e Obediência por Amor Filial

Um privilégio fundamental da liberdade cristã é o livre acesso a Deus (Romanos 5.1-2). Pela fé, os crentes são unidos a Cristo, recebendo Sua justiça e sendo introduzidos em um estado de favor divino, regozijando-se na esperança da glória de Deus (Romanos 5.1-3). Isso lhes permite aproximar-se de Deus com confiança, como filhos. Todo crente tem igual livre acesso a Deus por meio de Cristo.

A obediência cristã não é motivada pelo medo servil, mas por amor filial e um espírito voluntário (Romanos 8.14-15; 1 João 4.18). O Espírito de adoção, que os crentes recebem (Romanos 8.15), capacita-os a clamar "Aba, Pai" e a andar em conformidade com a vontade de Deus. A lei não é um fardo para os cristãos, mas um prazer (Salmos 1.2; 119.16, 24,97). O Espírito de Cristo submete e habilita a vontade do homem a fazer livre e alegremente o que a vontade de Deus, revelada na lei, requer (Ezequiel 36.27; Hebreus 8.10; Jeremias 31.33). A graça nos salva para "boas obras" (Efésios 2.8-10), e O evangelho é a grande razão para vivermos uma vida santa.

5) A Liberdade Ampliada no Novo Testamento

Embora os privilégios acima mencionados fossem comuns também aos crentes sob a lei (Gálatas 3.9,14), a liberdade dos cristãos no Novo Testamento está mais ampliada. Os crentes do Antigo Testamento, embora fossem filhos de Deus e tivessem direito à herança celestial, eram como "menores" sob a tutela da lei (Gálatas 4.1-2; 3.23-24).

I. Libertação do Jugo da Lei Cerimonial Sob o Novo Testamento. Os cristãos estão livres do jugo da lei cerimonial a que estava sujeita a Igreja judaica (Gálatas 4.1-3,6-7; 5.1; Atos 15.10-11). A lei cerimonial servia como um "pedagogo para nos conduzir a Cristo" (Gálatas 3.24) e como uma "parede divisória" entre judeus e gentios (Efésios 2.14), funções que foram abolidas em Cristo. As cerimônias da lei eram tipos e figuras do Cristo que haveria de vir (Hebreus 10.1), e as sombras se desvanecem quando a verdade se manifesta. O sacerdócio levítico e os sacrifícios, que eram propiciatórios pelos pecados, foram abolidos com a vinda do verdadeiro santuário em Cristo (Hebreus 9.1-10.18). Muitas coisas impostas aos judeus, como a abstenção de certas carnes e impurezas cerimoniais, não obrigam os cristãos (Atos 15.10-11; 1 Timóteo 4.4).

II. Mais Ousadia no Acesso ao Trono da Graça. A liberdade cristã no Novo Testamento se manifesta em ter mais ousadia no acesso ao trono da graça (Hebreus 4.14-16; 10.19-22). Enquanto os crentes do Antigo Testamento, embora filhos de Deus, eram como "menores", sujeitos a uma instrução rígida e ao temor do castigo, os crentes do Novo Testamento são "adultos e emancipados por Cristo", admitidos no santuário do Pai e com pleno senso de seu direito (Gálatas 4.4-5). Essa maior ousadia é resultado de Cristo ter aberto um novo e vivo caminho de acesso a Deus.

III. Mais Plenas Comunicações do Gracioso Espírito de Deus. O Novo Testamento se caracteriza por comunicações mais plenas do gracioso Espírito de Deus do que ordinariamente alcançavam os crentes sob a lei (João 7.38-39; 2 Coríntios 3.13,17-18). Embora o dom do Espírito estivesse incluído na promessa a Abraão e fosse prometido no Antigo Testamento (Isaías 44.3; Ezequiel 36.26-27), sua efusão foi peculiar ao Novo Testamento após a glória de Cristo (João 7.39). O Espírito Santo guia à toda a verdade (João 16.13), não por entusiasmo imediato, mas por meios ordenados como a pregação da Palavra (1 João 2.20; Romanos 12.2; Efésios 5.10; Filipenses 1.10). Essa maior medida do Espírito confere uma iluminação mais clara do intelecto e uma eficácia interna maior na santificação. O Espírito Santo é o Senhor e Doador da vida, e a fonte de todos os pensamentos bons, desejos puros e conselhos santos. Ele é o verdadeiro intérprete da palavra de Deus e habita no coração de cada crente.

Conclusão

A liberdade cristã, portanto, é um dom inestimável, integralmente adquirido pela obra redentora de Jesus Cristo, abrangendo a libertação da culpa do pecado, da ira condenatória de Deus, da maldição da lei moral, do domínio do pecado e de Satanás, e da condenação eterna. Essa liberdade se manifesta em um acesso confiante e sem entraves a Deus, impulsionando os crentes a uma obediência que brota de um amor filial e de um espírito voluntário, em contraste com o medo servil. Embora os crentes do Antigo Testamento partilhassem de muitos desses privilégios, a Nova Aliança trouxe uma ampliação notável dessa liberdade, particularmente na libertação do jugo da lei cerimonial, na ousadia aprimorada no acesso ao trono da graça e nas comunicações mais plenas e efetivas do Espírito Santo. Essa liberdade não é uma licença para a impiedade, mas um fortalecimento divino para uma vida de santidade e gratidão (Efésios 2.10), glorificando a Deus em todas as esferas da existência.

28 junho 2025

Disciplina na Igreja

A disciplina eclesiástica, um assunto de profunda relevância para a pureza e a saúde da Igreja, emerge como um ponto importante em nossos dias. Precisamos considerar que é um tema bíblico e, por isso, é necessário um estudo abrangente sobre seus fundamentos, evolução histórica, propósitos e desafios contemporâneos. Este texto tem a intenção de mostrar que a disciplina não é uma prática periférica, mas um distintivo intrínseco da verdadeira Igreja de Cristo, conforme articulado em confissões reformadas e nos ensinamentos apostólicos.

Símbolos Confessionais são unânimes em afirmar que a disciplina eclesiástica é uma das marcas essenciais que distinguem a Igreja verdadeira. A Confissão Belga, de 1561, escrita por Guido de Brés, já apontava que, junto à pregação pura do Evangelho e à correta administração dos sacramentos, o exercício da disciplina para castigar os pecados é fundamental. Essa tríplice marca é reforçada pela Confissão de Fé de Westminster que dedica um capítulo inteiro (capítulo XXX) à importância e à responsabilidade dos oficiais da Igreja em sua execução. A negligência dessa marca é vista como um fator que compromete a pureza da Igreja, ofuscando sua identidade e integridade diante do mundo.

A Confissão de Fé Escocesa declara que as marcas da verdadeira Igreja são: a verdadeira pregação da Palavra de Deus, a correta administração dos sacramentos de Jesus Cristo e, finalmente, a disciplina eclesiástica corretamente administrada, como prescreve a Palavra de Deus, para reprimir o vício e estimular a virtude. O Catecismo de Heidelberg explica que as "chaves do reino dos céus" são exercidas pela pregação do evangelho e pela disciplina cristã. Ele afirma que a igreja cristã tem a obrigação de excluir pessoas que se mostram incrédulas e ímpias, até que demonstrem arrependimento. 

A Segunda Confissão Helvética afirma que os ministros legitimamente chamados exercem as "chaves do Reino de Deus" quando "repreendem e exercem a disciplina sobre o povo confiado aos seus cuidados", abrindo o Reino dos Céus aos obedientes e fechando-o aos desobedientes. Além disso, destaca que "a disciplina é absolutamente necessária na Igreja". A Confissão de Fé Batista de Londres de 1689 menciona que Deus concedeu à Igreja "todo poder e autoridade necessários ao desempenho da forma de adoração e de disciplina por Ele instituídas para a observância na igreja". Os membros da igreja estão sujeitos à "disciplina e ao governo da igreja". Os Cânones de Dort mencionam que os apóstolos e mestres não descuidaram de manter o povo "sob a ministração da Palavra, dos sacramentos e da disciplina". Por fim, a Confissão de Fé de Guanabara descreve o governo da igreja verdadeira como aquele em que os "desvios sejam corrigidos e reprimidos" para manter a pureza da doutrina.

Fundamentação Bíblica da Disciplina

A base para a disciplina eclesiástica é solidamente encontrada nas Sagradas Escrituras, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, por meio do princípio do Progresso da Revelação. No Antigo Testamento, a santidade de Israel, pautada em ordenanças divinas, exigia a eliminação do pecado para manter a distinção do povo de Deus (Levítico 11:44-45). As punições severas serviam como advertência e para o bem-estar da congregação. O exílio na Babilônia é até mesmo interpretado como um modelo de disciplina divina visando arrependimento e obediência, culminando na restauração (Esdras 10:8). Embora as punições literais do Antigo Testamento não sejam válidas hoje, os princípios de que o pecado não deve ficar impune e de que o povo de Deus deve ser santo permanecem.

No Novo Testamento, Jesus e os apóstolos estabelecem o modelo para a aplicação da disciplina. Mateus 18:15-17 é a passagem primordial, delineando os passos: a admoestação particular (v. 15), o envolvimento de uma ou duas testemunhas (v. 16), e, se o pecador persistir, o assunto é levado à igreja (v. 17). Russell P. Shedd, em seu livro Disciplina na Igreja, afirma que não há passagem mais clara no Novo Testamento sobre a importância da disciplina.

Outras passagens cruciais incluem 1 Coríntios 5, que aborda o caso de imoralidade sexual pública na igreja de Corinto, instruindo a excomunhão do ofensor para a destruição da carne e salvação do espírito (1 Coríntios 5:1-5). Paulo também exorta a igreja a "expulsar o malfeitor" (1 Coríntios 5:13). A analogia do fermento (1 Coríntios 5:6-8) é usada para ilustrar como o pecado contamina toda a massa, justificando a ação disciplinar. Tito 3:10-11 instrui a admoestar o homem faccioso duas vezes e depois evitá-lo, indicando a disciplina para aqueles que causam divisões e ensinam heresias. 2 Tessalonicenses 3:6, 14-15 aborda a disciplina de irmãos que vivem desordenadamente, não trabalhando e se intrometendo na vida alheia, indicando o afastamento para que se envergonhem. 1 Timóteo 5:20 enfatiza a repreensão pública de pecadores contumazes "para que também os demais temam".

Um dos conceitos teológicos mais relevantes para a disciplina é o das "chaves do reino dos céus", outorgadas por Jesus à Sua Igreja (Mateus 16:18-19). Essa autoridade, simbolizada pelas chaves, refere-se ao poder de "ligar e desligar" ou "reter e remitir pecados". Estudiosos explicam que "ligar" e "desligar" se aplica tanto à pregação do evangelho e à admissão de penitentes na comunhão da igreja, quanto à exclusão daqueles que persistem no pecado. James Bannerman, em seu livro A Igreja de Cristo, destaca que essa linguagem não confere à Igreja o poder de perdoar a culpa eterna dos pecados, mas sim a autoridade de aplicar e remover censuras eclesiásticas em referência aos privilégios e punições exteriores da transgressão. Essa autoridade é exercida coletivamente pelos oficiais da igreja, como um presbitério, e não por um único indivíduo.

O propósito da disciplina eclesiástica é multifacetado e visa, antes de tudo, à pureza da Igreja. As fontes enumeram diversos objetivos:

• Restauração do pecador: O principal objetivo é levar o pecador ao arrependimento e à reconciliação com Deus e com a comunidade (Mateus 18:15; 1 Coríntios 5:5; Gálatas 6:1; Tiago 5:19-20).

• Manutenção da pureza e da santidade da Igreja: A disciplina serve para purificar a Igreja, removendo o "fermento" do pecado que poderia corromper toda a massa (1 Coríntios 5:6-8).

• Dissuasão de outros: A repreensão pública de pecadores contumazes serve como advertência para que outros não cometam pecados semelhantes (1 Timóteo 5:20).

• Vindicação da honra de Cristo e do Evangelho: A disciplina protege o nome de Cristo da desonra causada pelo pecado não tratado.

• Prevenção da ira de Deus: Ao lidar com o pecado, a Igreja evita que a ira de Deus caia sobre a comunidade por tolerar a profanação de seu pacto e sacramentos.

• Obediência e crescimento espiritual: A prática da disciplina demonstra a obediência da Igreja a Deus e promove o crescimento espiritual dos membros.

Os líderes eclesiásticos, sejam pastores ou presbíteros, têm uma responsabilidade primordial na administração da disciplina. Eles são vistos como pastores que prestarão contas a Deus por cada ovelha sob seu cuidado (Atos 20:28; Hebreus 13:17). A autoridade para "ligar e desligar" é confiada a esses oficiais, que a exercem de forma colegiada, e não individualmente, em contraste com o modelo católico-romano ou episcopal. O conselho da igreja, formado pelo pastor e presbíteros, é o corpo responsável pela aplicação da disciplina. A supervisão moral da congregação é parte integrante do trabalho dos presbíteros.


Tipos de Pecados e Níveis de Disciplina

Podemos distinguir entre diferentes tipos de pecados e os níveis apropriados de disciplina. Pecados podem ser classificados como:

• Pecados Privados/Secretos: Devem ser admoestados secretamente, começando com uma confrontação individual (Mateus 18:15).

• Pecados Públicos/Notórios: Aqueles que causam escândalo e são amplamente conhecidos devem ser tratados publicamente (1 Timóteo 5:20; 1 Coríntios 5).

Os passos da disciplina corretiva, conforme Mateus 18, são:

1. Abordagem individual: O ofendido procura o ofensor em particular, buscando o arrependimento.

2. Admoestação com testemunhas: Se o pecador não ouvir, uma ou duas testemunhas são levadas para que a palavra seja estabelecida.

3. Comunicação à Igreja: Se o pecador ainda assim não atender, o assunto é levado ao conhecimento da igreja (ou seus representantes, como o conselho de presbíteros).

4. Excomunhão/Exclusão: Se o pecador se recusar a ouvir a igreja, deve ser considerado "como gentio e publicano", ou seja, excluído da comunhão (Mateus 18:17). A excomunhão é a medida mais severa, reservada para pecados graves, notórios e impenitentes. No entanto, ela deve ser aplicada com o objetivo final de restauração, não de destruição.

O Legado dos Reformadores (Calvino, Knox, Bucer)

A Reforma Protestante foi crucial para o resgate da disciplina eclesiástica, que havia sido deturpada na Igreja Medieval. Martin Bucer (1491-1551) é reconhecido como uma influência significativa sobre João Calvino (1509-1564), especialmente em temas eclesiológicos e na prática da disciplina. Calvino, durante sua estadia em Estrasburgo (1538-1541), amadureceu seu pensamento teológico e incorporou ênfases de Bucer, embora suas ideias já estivessem em germe em suas obras anteriores, como as Institutas de 1536.

Heber Carlos de Campos Júnior, em seu artigo A Doutrina de Calvino sobre Disciplina Eclesiástica foi Principalmente Resultado da Influência de Martin Bucer?, conclui que, embora a influência de Bucer seja clara em tópicos como o uso dos Pais da Igreja, a reação aos anabatistas e a distinção entre níveis de pecado, não se pode afirmar que essa foi a principal ou única influência, já que as próprias experiências pastorais de Calvino e seu amadurecimento teológico foram determinantes. Contudo, Bucer tinha uma visão mais ampla da disciplina, incluindo instrução religiosa, confissão pública, admoestação fraterna e supervisão moral, e a imposição de penitência ou excomunhão para pecados graves. A criação do Consistório em Genebra por Calvino, um corpo com leigos e clérigos para supervisionar a moral, é vista como um resultado de sua experiência e das ideias de Bucer.

João Knox, principal figura da Reforma na Escócia, também foi influenciado por Calvino, integrando os interesses disciplinares calvinistas na administração da Igreja Presbiteriana da Escócia. O Primeiro Livro da Disciplina, coautorado por Knox, estabeleceu o desenvolvimento inicial da disciplina escocesa, distinguindo entre pecados públicos e privados, e prevendo a excomunhão como a sanção máxima para impenitentes.

O Declínio da Disciplina na Igreja Contemporânea

No entanto, devemos expressar grande preocupação com o declínio e a negligência da disciplina em muitas igrejas evangélicas hoje. Este fenômeno é atribuído a vários fatores:

• Pobreza Bíblica e Falta de Preparo Pastoral: Muitos pastores carecem de preparo sobre como implementar a disciplina eclesiástica, e os currículos de seminários tendem a subenfatizá-la em contraste com a pregação e os sacramentos.

• Evangelho Diluído e Pensamento Pós-moderno: Há uma resistência à disciplina devido a um evangelho diluído que enfatiza a felicidade terrena e o crescimento numérico, bem como o relativismo moral pós-moderno, onde "a verdade é relativa e cada pessoa tem sua própria verdade".

• Medo de Ações Legais e Diminuição de Membros: O medo de litígios e a preocupação com a redução do número de membros fazem com que as igrejas evitem a aplicação formal da disciplina.

• Tecnicismo e Linguagem Jurídica: A complexidade dos manuais disciplinares, com sua linguagem técnica e extensos procedimentos, pode ser um impedimento para a liderança.

A negligência da disciplina é vista como uma desobediência a Deus que compromete a saúde da igreja e sua existência.

A Importância da Harmonia, Unidade e Amor Fraternal

Embora a disciplina seja corretiva, precisamos destacar que ela deve ser aplicada com amor, gentileza e com o objetivo de reconciliação e restauração. O Concílio de Jerusalém em Atos 15 é apresentado como um modelo de como a Igreja Primitiva lidava com controvérsias e desavenças de forma consensual e pastoral, fundamentada na Palavra de Deus. A busca pela unidade e harmonia, pautada na fé comum e na oração, cria um ambiente propício para a resolução de conflitos e para a aplicação eficaz da disciplina. A disciplina deve ser um "remédio de salvação" para o pecador, visando seu arrependimento.

A disciplina não é apenas uma tarefa dos oficiais, mas um ministério de toda a Igreja. Começa com a autodisciplina individual. Jay E. Adams, em seu livro Handbook of Church Discipline, e Stephen Davey, em seu livro Disciplina Eclesiástica, corroboram que a palavra "disciplina" compreende métodos educativos e instrutivos, além de atitudes corretivas. A santidade é algo comunitário, e cada crente é responsável por zelar pela pureza da Igreja. O livro Entendendo a Disciplina da Igreja, de Jonathan Leemanenfatiza que cada membro tem um trabalho a fazer, incluindo participar da disciplina, confrontando o pecado em amor, inicialmente de forma privada, e progredindo para os níveis mais públicos se o arrependimento não ocorrer. A disciplina funciona melhor em uma cultura eclesiástica marcada pelo encorajamento e pelo amor, onde as pessoas se conhecem e confiam umas nas outras.

Em resumo, a disciplina eclesiástica é uma ordenança divina e uma bênção para o povo de Deus, fundamental para a preservação da pureza da Igreja, a honra do nome de Cristo e a restauração do pecador. Seu fiel exercício, enraizado em princípios bíblicos e temperado pelo amor pastoral, é um imperativo para qualquer congregação que deseje ser fiel ao Senhor e manifestar um testemunho eficaz no mundo.


26 junho 2025

A Nação de Israel nos Símbolos de Fé de Westminster

Este texto tem a intenção de mostrar o entendimento dos Puritanos, através dos documentos que eles mesmo redigiram no século XVII, sobre o que eles pensavam a respeito da nação de Israel. As declarações da Confissão de Fé, do Catecismo Maior e do Breve Catecismo são exposições do pensamento puritano, o qual entendo ser a interpretação mais próxima das Escrituras.

Os Símbolos de Fé de Westminster esclarecem que Israel, como nação, foi historicamente o povo de Deus no Antigo Testamento. Contudo, o conceito de "povo de Deus" se expandiu para incluir a Igreja, composta por crentes de todas as nações, após a vinda de Cristo. Este estudo pretende detalhar essa compreensão, abordando o papel de Israel no plano divino e a transição para a universalidade da Igreja no pensamento puritano.

1) Israel como Povo de Deus no Antigo Testamento

Os Símbolos de Fé de Westminster explicitam que Israel era o povo escolhido por Deus para um propósito especial no Antigo Testamento.

✔ Pacto Divino: Deus estabeleceu um pacto específico com Israel, libertando-os da escravidão. O prefácio dos Dez Mandamentos, conforme a Pergunta 43 do Breve Catecismo de Westminster e a Pergunta 101 do Catecismo Maior de Westminster, declara: “Eu sou o SENHOR teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”. O Catecismo Maior de Westminster ainda enfatiza que, nessas palavras, Deus se manifesta como "um Deus em pacto com todo o seu povo e com o Israel antigo".

✔ Igreja sob Tutela: Israel era considerado uma "Igreja sob sua tutela". A Confissão de Fé de Westminster (Capítulo III, Seção IV) afirma que Deus deu a Israel "leis cerimoniais que contêm diversas ordenanças típicas", considerando-os uma Igreja sob sua orientação.

✔ Guardiões das Escrituras: As Escrituras do Antigo Testamento foram originalmente escritas em hebraico, a "língua original do antigo povo de Deus" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo I, Seção VIII). Além disso, "aos judeus foram confiados os oráculos de Deus", como citado na Confissão de Fé de Westminster (Capítulo I, Seção III, com referência a Romanos 3:2; e Catecismo Maior de Westminster, Pergunta 4).

✔ Origem da Salvação: A salvação teve sua origem nos judeus, como afirmado em João 4:22 e no Capítulo XXI, Seção V da Confissão de Fé de Westminster: “a salvação vem dos judeus”.

✔ Cristo como Rei de Israel: Cristo, como Redentor, exerce o ofício de Rei e é reconhecido como "o Rei de Israel!" conforme João 1:49, citado na Pergunta 23 do Breve Catecismo de Westminster.

2) A Transição e a Igreja como o Povo de Deus no Novo Testamento

Com a vinda de Cristo, houve uma mudança fundamental na relação de Deus com seu povo, culminando na universalização da Igreja.

✔ Abolição das Leis Cerimoniais e Judiciais: As leis cerimoniais e judiciais dadas a Israel foram "todas abolidas sob o Novo Testamento" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XIX, Seção III), e as leis judiciais "deixaram de vigorar quando o país daquele povo também deixou de existir" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XIX, Seção IV). Isso indica uma mudança na forma de relacionamento de Deus com seu povo e o cumprimento do propósito nacional de Israel em sua forma anterior.

✔ Pacto da Graça Universal: O pacto da graça, base da relação de Deus com seu povo, é feito "com Cristo, como o segundo Adão; e, nele, com todos os eleitos, como sua semente" (pergunta 31 do Catecismo Maior de Westminster). Este pacto é uma continuidade da promessa feita a Abraão, visando que a "bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI e pergunta 34 do Catecismo Maior de Westminster, também Gálatas 3:14). A justificação de Deus é "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem; porque não há distinção" entre judeus e gentios (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI; pergunta 70 do Catecismo Maior de Westminster e pergunta 35 do Catecismo Maior de Westminster).

✔ Natureza Universal da Igreja: A Igreja visível não está mais restrita a uma nação. Sob o Evangelho, a graça e a salvação são manifestadas "em maior plenitude, evidência e eficácia a todas as nações" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo VII, Seção VI; Catecismo Maior de Westminster, pergunta 35). Jesus ordenou que se fizessem discípulos de "todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo". A pregação do arrependimento para a remissão de pecados deve ser feita "a todas as nações, começando de Jerusalém".

✔ Terminologia Aplicada à Igreja: A Igreja é descrita com termos que antes se aplicavam a Israel, como "raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus" (1 Pedro 2:9), mostrando que os crentes, tanto judeus quanto gentios, agora formam o povo de Deus. A Igreja visível, sob o Evangelho, "não sendo restrita a uma nação, como antes, sob a Lei", agora é "católica ou universal", composta por "todos aqueles que, pelo mundo inteiro, professam a verdadeira religião, juntamente com seus filhos" (Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XXV, Seção II; Catecismo Maior de Westminster, pergunta 62).

✔ Batismo como Sinal da Nova Aliança: O Batismo, como sinal e selo da aliança, é aplicado não apenas aos que professam fé, mas também aos "filhos de pais crentes (ainda que só um deles o seja)" (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXVIII, Seção IV). Isso é análogo à circuncisão no Antigo Testamento (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXVIII, Seção I; Catecismo Maior de Westminster pergunta 165; Breve Catecismo de Westminster pergunta 94), que era o "selo da justiça da fé" para Abraão, tornando-o "o pai de todos os que creem", independentemente de serem circuncidados ou não. Isso reitera a inclusão de todos os crentes e seus descendentes na aliança.

✔ Essa continuidade demonstra a inclusão de todos os crentes e seus descendentes na aliança, uma vez que o pacto da graça, sob o evangelho, manifesta-se "com mais plenitude, evidência e eficácia espiritual a todas as nações – tanto aos judeus como aos gentios" (Confissão de Fé de Westminster Capítulo VII, Seção VI; Catecismo Maior de Westminster pergunta 35). A justificação de Deus é "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem; porque não há distinção" entre judeus e gentios (Rm 3.22; Confissão de Fé Capítulo VII, Seção VI). De fato, a justificação dos crentes, tanto sob o Antigo Testamento quanto sob o Novo Testamento, é, em todos os aspectos, "uma e a mesma" (Confissão de Fé Capítulo XI, Seção VI).

✔ Inclusão de Judeus na Igreja Universal: As orações na Oração Dominical incluem o pedido para que o evangelho seja propagado por todo o mundo, os "judeus, chamados, e que a plenitude dos gentios seja trazida à Igreja" (Catecismo Maior de Westminster, pergunta 191). Isso indica que o plano de Deus para Israel, como povo, é que eles sejam chamados e integrados na mesma Igreja que inclui os gentios. A Igreja invisível é definida como "o número completo dos eleitos que foram e que serão reunidos em um corpo sob Cristo, o Cabeça" (Catecismo Maior de Westminster, pergunta 64), reforçando a ideia de uma unidade futura do povo de Deus sob Cristo.

Portanto...

Os Símbolos de Fé de Westminster não defendem que a nação de Israel ainda possua um propósito específico, à parte da Igreja, no sentido de uma missão ou função nacionalmente distinta. Pelo contrário, eles indicam que o propósito de Deus é que os judeus, assim como os gentios, sejam chamados eficazmente e se unam à Igreja de Cristo, formando um único "povo de Deus" universal (Confissão de Fé de Westminster Capítulo XXV, Seção II; Catecismo Maior de Westminster pergunta 191).

Os Símbolos de Westminster afirmam que Israel foi a nação escolhida por Deus para revelar sua lei e salvação, sendo o "antigo povo de Deus". No entanto, com a Nova Aliança em Jesus Cristo, o conceito de "povo de Deus" universalizou-se e expandiu-se para incluir crentes de todas as nações, formando a Igreja. Essa expansão não anula a eleição histórica de Israel, mas demonstra a plenitude do plano de Deus para justificar e chamar a si pessoas de toda a humanidade "mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem".

23 junho 2025

O Que é o Princípio Regulador do Culto?

O Princípio Regulador do Culto diz respeito à forma do culto público e ao modo como Deus deve ser adorado. Ele afirma que o culto público deve ser bíblico. Em oposição a outras visões (como o princípio normativo defendido por católicos romanos e anglicanos), que sustentam que o que não é diretamente proibido nas Escrituras é permitido no culto, o Princípio Regulador sustenta que o que não for diretamente ensinado nas Escrituras ou necessariamente inferido de seu ensino é proibido no culto. Colocado de forma positiva, o princípio regulador afirma que só é permitido no culto aquilo que tiver real fundamentação bíblica.

Este princípio é, na verdade, a aplicação das doutrinas reformadas da autoridade e da suficiência das Escrituras ao culto. A fé reformada sustenta que as Escrituras são plenamente suficientes em matéria de fé e prática, contendo tudo o que é necessário para a salvação e para viver de modo agradável a Deus. Portanto, nada deve ser acrescentado à Palavra de Deus. Os reformadores e puritanos entendiam que o próprio Deus revela este princípio em Sua Palavra.

Fundamentação Bíblica

Podemos citar diversas passagens bíblicas como base para o Princípio Regulador:

1. Deuteronômio 4:1,2 e 12:32:

Deuteronômio 4:1,2: "Agora pois, ó Israel, ouve os estatutos e os juízos que eu vos ensino... Nada acrescentareis à palavra que vos mando, nem diminuireis dela...". Embora não se trate de uma referência especificamente relacionada apenas ao culto, ela evidentemente também inclui o culto público. John Knox argumentou que esta passagem proíbe o homem de fazer a Deus o que pensa ser apropriado, exigindo obediência a todas as Suas Leis, incluindo estatutos, ritos e cerimônias.

Deuteronômio 12:32: "Tudo o que eu te ordeno, observarás; nada lhe acrescentarás nem diminuirás". Este versículo diz respeito exatamente ao culto, sendo a conclusão de um capítulo que trata especificamente do culto público. É considerado um versículo bíblico clássico na defesa reformada do princípio regulador.

2. Levítico 10:1,2 (Nadabe e Abiú): 

O exemplo de Nadabe e Abiú oferecendo fogo estranho que Deus não havia ordenado demonstra que no culto a Deus não pode haver nada apresentado a Deus que Ele não tenha ordenado. Tudo o que se pratica no culto a Deus deve ter fundamentação proveniente da Palavra de Deus. Oferecer "fogo estranho" (não autorizado) é visto como abominação.

3. Mateus 15:9 (citando Isaías 29:13): 

Jesus considera vã (despropositada) a adoração resultante do ensino e tradições humanas: "E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens". Isso demonstra a condenação bíblica de doutrinas e práticas de culto que não são derivadas da Escritura.

4. Colossenses 2:16-23: 

Este texto do Novo Testamento também é citado em defesa do princípio regulador puritano. Paulo condena a "religião auto-imposta" ou "culto da vontade" (ethelothreskeia), que significa culto que se origina da própria vontade do homem. As regras e regulamentos feitos pelo homem "não têm valor algum". Paulo aplica rigorosamente o princípio regulador aqui, condenando qualquer adição ao que Deus ordenou ou autorizou. A passagem, assim como Mateus 15, espelha a condenação às tradições humanas quanto à doutrina, ética e culto.

5. João 4:24: 

Jesus diz que "Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade". "Em verdade" denota conformação à verdade revelada de Deus, submissão à Sua Palavra, e aponta especialmente para a conformação às formas externas de culto prescritas por Deus na Sua Palavra. Este princípio de adoração "em espírito e em verdade" estava em vigor na velha e nova alianças. Adorar adequadamente a Deus significa fazê-lo em conformidade com Sua natureza e caráter, achegando-se a Ele em Seus próprios termos e regras, o que significa que o culto deve ser prescrito pela Escritura e não por homens.

O Que é Permitido Segundo o Princípio?

O Princípio Regulador não é a ideia simplista de que "se não está ordenado, está proibido". A definição mais ampla e correta do princípio reformado histórico e confessional afirma que só é permitido no culto o que for expressamente declarado na Escritura ou que possa ser lógica e claramente deduzido dela. Isso inclui:

• Mandamento direto: Como "fazei isto em memória de mim" (Lucas 22:19).

• Inferência lógica e clara: Doutrinas importantes como a Trindade ou a união hipostática são inferidas logicamente das Escrituras. A admissão de mulheres à mesa do Senhor é citada como um exemplo de inferência lógica para uma prática de culto. O significado da Escritura, incluindo suas implicações lógicas, é autoritativo.

• Exemplo histórico aprovado: Uma prática de culto pode ser sancionada por um exemplo histórico aprovado na Bíblia. A mudança do dia de culto público do sétimo para o primeiro dia é um exemplo citado. Exemplos como a oferta de Abel (Gênesis 4:3) ou Noé (Gênesis 8:20) são vistos como baseados em prévia comunicação ou sanção divina, mesmo que não registrada explicitamente como um mandamento para todos.

Elementos Comuns de Culto

Com base na Escritura e no Princípio Regulador, as igrejas reformadas históricas identificaram elementos comuns de culto, práticas específicas válidas para a dispensação do evangelho. A Confissão de Fé de Westminster reflete esta posição. Alguns desses elementos comuns incluem:

• A leitura bíblica.

• A pregação da Palavra.

• A reverente atenção a ela.

• A oração.

• O louvor (cântico de Salmos, hinos e cânticos espirituais).

• A ministração das duas ordenanças: Batismo e Ceia do Senhor.

• A bênção apostólica.

• A apresentação de dízimos e ofertas.

Circunstâncias do Culto

É crucial distinguir entre os elementos (partes do culto que requerem sanção divina específica) e as circunstâncias do culto. Há algumas circunstâncias, comuns às ações e sociedades humanas (como o tipo de edifício, horários, cadeiras, etc.), que não são ordenadas nem proibidas na Palavra de Deus. Estas devem ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as regras gerais da Palavra. As circunstâncias não afetam diretamente o conteúdo ou as partes do culto religioso. A tentativa de confundir elementos e circunstâncias é vista como um meio de burlar o princípio regulador e introduzir inovações humanas no culto.

Princípio Libertador

Na concepção reformado-puritana, o princípio regulador não tolhe ou limita a liberdade cristã; pelo contrário, ele a preserva da imposição do cerimonialismo do qual Cristo nos libertou e de quaisquer imposições litúrgicas à liberdade de consciência. Adotar ou obedecer a mandamentos humanos em matéria de consciência é visto como trair a verdadeira liberdade de consciência.

Importância

O Princípio Regulador é considerado um dos pilares da Reforma Calvinista. Sem ele, não haveria uma regra suficiente e autoritativa para o culto, tornando difícil definir o que é permitido e preservar o culto das tradições, invenções e superstições humanas. A luta pela reforma do culto, baseada neste princípio, precisa continuar nos dias atuais.

Em resumo, o Princípio Regulador do Culto Reformado estabelece que a adoração a Deus no culto público deve ser baseada exclusivamente no que Deus ordenou em Sua Palavra, seja por mandamento direto, inferência necessária ou exemplo bíblico aprovado, distinguindo-o das circunstâncias que são ordenadas pela prudência sob regras gerais da Escritura. Este princípio visa garantir que o culto seja conforme a vontade revelada de Deus, e não baseado na imaginação ou tradição humana.


07 junho 2025

A Base da Perseverança dos Crentes

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo XVII. Da Perseverança dos Santos 

Seção II. Esta perseverança dos santos não depende do próprio livre-arbítrio deles, mas da imutabilidade do decreto da eleição, procedente do livre e imutável amor de Deus Pai, da eficácia do mérito e intercessão de Jesus Cristo, da permanência do Espírito e da semente de Deus neles e da natureza do pacto da graça; de todas essas coisas vem a sua certeza e infalibilidade. 



A doutrina da perseverança dos santos ensina que aqueles que Deus aceitou, chamou eficazmente e santificou pelo seu Espírito não podem cair do estado de graça, nem total nem finalmente. Esses crentes têm a certeza de que hão de perseverar nesse estado até ao fim e estarão eternamente salvos. Essa doutrina se refere a cada indivíduo chamado eficazmente, garantindo que nenhum deles se apostatará finalmente ou se perderá, mas cada um certamente perseverará e será salvo. 

Vamos agora compreender que esta perseverança não depende de fatores humanos, mas de ações e atributos divinos: 

1) Esta perseverança dos santos não depende do próprio livre-arbítrio deles 

As Escrituras enfatizam que a salvação, incluindo a perseverança, não se baseia na capacidade ou vontade humana, mas na soberana vontade de Deus, ou seja, eles não decidem nascer de novo, não isso não depende deles (João 1:12-13; Romanos 9:16). Se deixado por si mesmo, o cristão certamente cairia devido à sua fraqueza natural, propensão ao pecado e às tentações. Por natureza o coração do homem é enganoso, não merece confiança (Jeremias 17:9; Marcos 14:38). 

A graça divina é eficaz e, em vez de depender da vontade humana, o Espírito opera para que os crentes queiram obedecer (Filipenses 2:13). 

A perseverança é um dom de Deus, não uma atividade contínua inerente ao homem (João 10:28-29). A ideia de que a perseverança depende da incerta obediência humana é negada, como se vê historicamente no contraste com posições semipelagianas e arminianas (Efésios 2:8-9). 

2) Depende da imutabilidade do decreto da eleição, procedente do livre e imutável amor de Deus Pai 

A perseverança baseia-se no firme fundamento de Deus, que é a eleição divina (2 Timóteo 2:19). Essa eleição é um decreto imutável, que brota do livre e imutável amor de Deus Pai (Jeremias 31:3). A eleição não se baseia em obras ou fé previstas no homem, mas no soberano beneplácito de Deus, sendo eterna e incondicional (Efésios 1:4-5; Romanos 9:11-13). 

A imutabilidade de Deus em seu Ser, atributos, propósitos, motivos e promessas assegura a salvação dos eleitos (Malaquias 3:6; Hebreus 6:17-18). Deus conhece os que lhe pertencem, tendo-os escolhido para a vida eterna (2 Timóteo 2:18-19; João 10:14). O amor de Deus por seu povo é peculiar e o induziu a enviar seu Filho para a redenção deles (João 3:16; Romanos 5:8). Os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis (Romanos 11:29), e Ele nunca se arrepende de havê-los dado (Números 23:19; 1 Samuel 15:29). Quando Deus ama, é com um amor eterno. Não é um amor temporal ou passageiro. Uma vez que o homem se torna alvo do amor de Deus, sempre será alvo deste amor eterno (Jeremias 31:3). 

3) Depende da eficácia do mérito e intercessão de Jesus Cristo 

A perseverança dos santos é assegurada pela obra de Cristo. Cristo veio para salvar seu povo de seus pecados, não meramente para tornar a salvação possível, mas para efetivamente livrá-los (Mateus 1:21; João 10:11). Aqueles que o Pai deu a Cristo virão a Ele com certeza e Ele de modo nenhum deixará que escapem (João 6:37). Cristo dá vida eterna às suas ovelhas, e ninguém as tirará da sua mão, muito menos da mão do Pai (João 10:28-29). Ele morreu por aqueles que lhe foram dados pelo Pai para que pudesse lhes dar vida eterna e não perder um só deles (João 17:2,11,12,24). 

A intercessão de Cristo diante do Pai é constante (Hebreus 7:25) e eficaz, pois o Pai sempre ouve as suas orações (João 11:42). Por meio da sua intercessão, a fé dos eleitos não pode falhar (Lucas 22:32). Cristo orou em favor de Pedro, para que a sua fé não desfalecesse, comportamento bem diferente com relação a Judas Iscariotes. Nada pode separar os crentes do amor de Deus que está em Cristo Jesus (Romanos 8:38-39). 

Como agora Ele vive para interceder por nós (Hebreus 12:25), a preservação da nossa fé é assegurada pelo contínuo suprimento de Sua graça, suprimento esse que, de outra forma, não seria suficiente para a nossa preservação. Está manifesto que Paulo tinha essas mesmas coisas em mente quando escreveu aos filipenses: "Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus" (Filipenses 1:6). 

4) Depende da permanência do Espírito e da semente de Deus neles 

A perseverança depende da habitação permanente do Espírito em oposição a uma presença temporária (João 14:16). O Espírito Santo habita nos crentes, controla sua vida interior e exterior, iluminando, guiando, santificando, fortalecendo e confortando (Romanos 8:9; Gálatas 5:16-18; João 16:13-14). 

O Espírito é o autor imediato da regeneração, fé e todos os santos exercícios, infundindo novas qualidades no coração (Tito 3:5; 1 Coríntios 12:3). Ele sela os crentes para o dia da redenção (Efésios 1:13; Efésios 4:30), o que confirma a certeza das promessas de Deus e implica a constância da fé. 

A unção que os crentes recebem permanece neles, ensinando-os interior e imediatamente (1 João 2:27). A semente divina que permanece naquele que é nascido de Deus faz com que ele não viva na prática do pecado (1 João 3:9). O que acontece na regeneração dura para sempre, é imortal: o homem interior do coração é incorruptível, porquanto gerado é da semente incorruptível (1 Pedro 3:4). "Fostes regenerados, não de semente corruptível, mas de incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente" (1 Pedro 1:23). 

A graça no coração é aqui representada como sendo incorruptível e permanente, livrando o crente do pecado, isto é, de uma vida de pecados, na qual vivem as pessoas não regeneradas. Assim sendo, Deus coloca seu Espírito no crente e faz com que ele ande nos seus estatutos (Ezequiel 36:26-27). 

A mesma verdade é ensinada nas seguintes palavras de Cristo: "Quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida" (João 5:24). A nova vida que a graça produz é aqui chamada de "vida eterna", é uma possessão do crente desde o presente. A sua perpetuidade é declarada nas palavras: "Não entra em juízo". Se quem já foi feito uma nova criatura e foi justificado mediante a fé pudessem voltar ao mesmo estado do qual foi resgatado pela graça, esse alguém estaria novamente sob o juízo de Deus. Mas Jesus afirmou ser isso impossível. 

Se os que já passaram da morte para a vida podem voltar novamente à morte, então a presente vida que possuem não é eterna, e a declaração "não entra em juízo" fica sem fundamento. 

Aquele que começou a boa obra no crente há de completá-la até ao dia da vinda de Cristo Jesus (Filipenses 1:6). O Espírito utiliza meios como a Palavra de Deus para operar e confirmar a fé e a santidade (2 Timóteo 3:16-17; 1 Pedro 1:23). 

5) Depende da natureza do pacto da graça 

A perseverança dos santos também é assegurada pela natureza do pacto da graça. Este pacto é firme e imutável e nunca poderá ser anulado, pois está fundado unicamente na graça de Deus e não na obediência do homem (Hebreus 13:20-21). 

Deus garante no pacto que tudo o que deve acontecer para a salvação será alcançado (Isaías 55:10-11). No pacto da graça, Deus promete colocar a sua lei nos corações do seu povo e pôr o seu temor dentro deles para que não se apartem dEle (Jeremias 31:33-34; Hebreus 8:10). Podemos acrescentar a passagem de Jeremias 32:40, onde Deus promete que aqueles a quem Ele fez uma aliança jamais se afastarão dEle. O conceito de Deus agindo ativamente no crente para garantir sua fidelidade e não se apostatar é central para a descrição do novo pacto encontrada nas passagens já citadas. 

Conclusão: De todas essas coisas vem a sua certeza e infalibilidade 

A certeza e infalibilidade da perseverança derivam da eleição imutável de Deus, do mérito e intercessão eficaz de Cristo, da permanência do Espírito e da semente divina, e da natureza do pacto da graça. A certeza não se baseia na constância humana, mas no propósito de Deus, na obra de Cristo, na habitação do Espírito e no amor imutável de Deus. 

Os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento, assegurando que aqueles que Ele justificou nunca serão condenados (Romanos 11:29). O selo do Espírito confirma a certeza das promessas de Deus e da salvação (Efésios 1:13-14). Deus é fiel e guardará os crentes do Maligno (2 Tessalonicenses 3:3). 

A apostasia de alguns não invalida a fidelidade de Deus e a certeza do seu conselho para com os eleitos (1 João 2:19). As ovelhas de Cristo jamais perecerão, e ninguém as arrebatará das mãos dEle (João 10:28). Esta certeza não leva à licenciosidade, mas ao zelo e à santidade (Romanos 6:1-2). 


A Doutrina da Perseverança dos Santos

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo XVII. Da Perseverança dos Santos 

Seção I. Os que Deus aceitou em seu Bem-amado, os que ele chamou eficazmente e santificou pelo seu Espírito, não podem cair do estado de graça, nem total nem finalmente, mas com toda a certeza hão de perseverar nesse estado até ao fim, e estarão eternamente salvos. 



A doutrina da perseverança final dos santos afirma que aqueles que foram chamados eficazmente por Deus para exercer a fé genuína certamente permanecerão firmes até a salvação final. Isso não se aplica a uma classe geral de pessoas de forma usual, mas a cada indivíduo dentro dessa classe, de modo que nenhum deles apostatará ou se perderá definitivamente; cada um certamente perseverará e será salvo. As Escrituras ensinam essa salvação final de todos os crentes.

As Escrituras, e a CFW se baseia nelas, indicam que esta perseverança não se deve à excelência ou poder do crente, mas sim ao propósito e poder de Deus e à graça que Ele concede.

Reconhece-se a fraqueza do homem, que, se deixado por si só, certamente cairia, um perigo contra o qual o crente é constantemente advertido. Mesmo os mais instruídos e santificados estão sujeitos a esse perigo, evidenciado pelos pecados cometidos, que podem, por vezes, ser graves, chegando até mesmo à negação real da fé e ao afastamento de Deus. Entretanto, do perigo inerente a si mesmo, o crente é resgatado pelo poder e pela graça de Deus, que, por Sua vigilante preservação, guarda Seus filhos indignos, impedindo que se afastem totalmente dEle e os conduzindo finalmente à salvação que Ele planejou. Ao fazer isso, Deus não age independentemente da cooperação do crente, mas os conduz à salvação através de sua própria perseverança na fé e santidade.

Diversas passagens bíblicas são apresentadas para apoiar esta doutrina. Por exemplo, João 10.27-29 declara: "As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar". Este texto é usado para mostrar a segurança das ovelhas nas mãos de Cristo e do Pai.

Outro texto fundamental é Filipenses 1.6: "Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus". Este verso apoia a ideia de que a obra de Deus na vida do crente é contínua e será concluída.

A certeza da salvação do crente é atribuída ao propósito de Deus. As Escrituras afirmam que aqueles que creem foram "ordenados à vida eterna" (Atos 13.48), e aqueles que são finalmente glorificados foram preordenados para serem conformados à imagem de Cristo e, portanto, chamados (Romanos 8.29).

O próprio Jesus declarou que é a vontade do Pai que Ele "não perca nada de tudo o que ele me deu, mas o ressuscite no último dia" (João 6.39). E ainda temos 1 Pedro 1:5,9: "Vocês são guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação preparada para ser revelada no último tempo. (...) Pois vocês estão alcançando o alvo da fé, a salvação da alma". Esta salvação final é, portanto, vista como uma inferência necessária dessas doutrinas.

Além do poder de Deus, a perseverança também é atribuída à graça de Deus. Romanos 4.16 afirma que a salvação deve ser pela fé, "a fim de que a promessa seja certa para toda a descendência". Aqueles que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus (Romanos 8.14), e a salvação não depende do querer ou do correr do homem, "mas de Deus" (Romanos 9.16).

Deus implanta no seu eleito uma semente que se torna garantia de que ele é um nascido de Deus e que por isso ele irá perseverar nos caminhos dEle, como diz 1 João 3:9: "Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado, pois o que permanece nele é a semente divina; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus".

A operação do Espírito Santo nos crentes, descrita como "selagem" (Efésios 1.13; 4.30), também é apresentada como prova da "certeza da salvação e da perseverança". Este selo é considerado "indestrutível" e para "o dia da redenção", ou seja, até o fim. A selagem para a obtenção infalível da salvação implica a selagem para a contínua constância da fé. O Espírito habita perpetuamente nos crentes, consolando- os e sustentando-os continuamente até o fim.

Cristo também intercede constantemente pelos crentes (Hebreus 7.25), e Suas orações são eficazes, pois o Pai sempre as ouve (João 11.42). O Espírito Santo também intercede por nós (Romanos 8.26). Temos aqui a Trindade agindo em conjunto para conformar a obra de salvação para todos os eleitos.

A doutrina da perseverança final está repleta de consolação para o crente prestes a desfalecer em seu conflito espiritual. Ao encontrar evidências do amor de Deus em seu coração, o crente é autorizado a considerar essa graça como um penhor de sua herança futura. No entanto, as Escrituras Sagradas, a Palavra de Deus, também mencionam advertências contra a apostasia encontradas nas Escrituras (Mateus 24.3-14, Colossenses 1.21-23a, 1 Coríntios 10.12, Hebreus 2.1).

Essas advertências não são vistas como prova de que um crente verdadeiramente regenerado possa perder a salvação, mas sim como meios que Deus usa para motivar os crentes a permanecerem comprometidos com Ele. Observe 2 Pedro 1:10: "Por isso, irmãos, empenhem-se cada vez mais para consolidar o chamado e a eleição de vocês; porque, fazendo isso, vocês jamais tropeçarão".

A necessidade de perseverar na fé deve ser usada como advertência contra abandonar a fé, indicando que quem a abandona dá evidência de que sua fé nunca foi real. Textos das Escrituras que parecem apresentar casos de apostasia real podem ser argumentados como não provando que essas pessoas realmente receberam a graça da regeneração ou que a perderam de forma permanente. Quanto a esses textos iremos analisar em uma EBD logo após a conclusão deste capítulo. Podem me cobrar!

Em resumo, esta doutrina, conforme apresentada na Confissão e baseada na Palavra de Deus, sustenta que a perseverança dos santos é uma obra segura de Deus em favor daqueles que Ele eficazmente chamou e santificou, garantindo que eles não cairão final ou totalmente do estado de graça, mas serão preservados pelo poder, propósito e graça divina até a salvação final. Esta doutrina oferece grande consolação e as advertências nas Escrituras servem como um meio para encorajar e manter o crente no caminho da fé e santidade.

20 abril 2025

Confessando a Deus e aos Irmãos: O Dever do Arrependimento Específico na Vida Cristã

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo XV. Do Arrependimento Para a Vida 

Seção V. Os homens não devem se contentar com um arrependimento geral, mas é dever de todos procurar arrepender-se particularmente de cada um de seus pecados.

Seção VI. Como cada homem é obrigado a fazer a Deus confissão particular de seus pecados, pedindo-lhe o perdão deles (e abandonando-os achará misericórdia); assim também aquele que escandaliza a seu irmão ou a Igreja de Cristo deve estar pronto, por meio de uma confissão particular ou pública de seu pecado e do pesar que por ele sente, a declarar o seu arrependimento aos que estão ofendidos; isso feito, estes devem reconciliar-se com o penitente e recebê-lo em amor.




A reflexão sobre a natureza do arrependimento e da confissão revela uma dinâmica essencial da vida cristã, que vai além de uma mera constatação genérica de falibilidade humana. As Escrituras e a tradição teológica reformada consistentemente apontam para a necessidade de um engajamento pessoal e específico com os próprios pecados. A Confissão de Fé de Westminster articula essa necessidade, afirmando que os homens não devem se contentar com um arrependimento geral, mas têm o dever de procurar arrepender-se particularmente de cada um de seus pecados. Este mandamento implica um exame de consciência diligente, conforme sugerido em Salmos 19:13, que exorta a buscar libertação de transgressões desconhecidas.

A obrigação de confessar pecados não se limita a um foro íntimo com Deus. Como cada pessoa é obrigada a fazer a Deus uma confissão particular de seus pecados, pedindo-lhe perdão e, crucialmente, abandonando-os para alcançar misericórdia, a dinâmica da confissão se estende ao âmbito das relações interpessoais dentro da comunidade da fé. Aquele que causa escândalo a um irmão ou à Igreja de Cristo tem um dever correlato: estar pronto a declarar seu arrependimento àqueles que foram ofendidos, através de uma confissão particular ou pública de seu pecado e do pesar que por ele sente. Este reconhecimento da transgressão e a demonstração de contrição são passos necessários para que os ofendidos possam se reconciliar com o arrependido e recebê-lo em amor.

Essa perspectiva sobre o arrependimento e a confissão destaca a seriedade do pecado não apenas como uma ofensa vertical contra Deus, mas também como uma ruptura horizontal na comunhão do corpo de Cristo. A busca por reconciliação, portanto, envolve tanto o reconhecimento da culpa diante de Deus quanto a reparação das relações danificadas com o próximo. A prontidão em confessar e o subsequente ato de perdoar e receber o ofensor arrependido refletem o evangelho da reconciliação em ação dentro da igreja. De modo geral, o tema da necessidade de arrependimento particular e confissão, tanto a Deus quanto aos ofendidos, lança luz sobre a profundidade da transformação pessoal e a importância da restauração da comunhão na vida cristã.

1. A Insuficiência do Arrependimento Geral e a Necessidade do Arrependimento Particular

A seção V inicia afirmando categoricamente que "Os homens não devem se contentar com um arrependimento geral, mas é dever de todos procurar arrepender-se particularmente de cada um de seus pecados". Esta declaração destaca a importância de um exame de consciência individual e minucioso, onde cada transgressão é trazida à luz e reconhecida diante de Deus.

Podemos usar como referência bíblica para esta afirmação o Salmos 19:13: "Também da soberba guarda o teu servo, que ela não me domine; então serei irrepreensível, e ficarei livre de grande transgressão". Este versículo demonstra a consciência do salmista sobre pecados específicos, em particular a soberba, e seu desejo de ser guardado deles para ser irrepreensível.

Outro exemplo que podemos citar é o de Lucas 19:8: "Entrementes, Zaqueu se levantou e disse ao Senhor: Senhor, resolvo dar aos pobres metade de meus bens; e, se nalguma coisa tenho defraudado alguém, restituo quatro vezes mais". A atitude de Zaqueu ilustra um arrependimento concreto e direcionado a pecados específicos de extorsão e roubo, com a disposição de fazer restituição.

O terceiro texto que podemos nos apoiar é 1 Timóteo 1:13-15: "… a mim, que, noutro tempo, era blasfemo, e perseguidor, e insolente. Mas obtive misericórdia, pois o fiz na ignorância, na incredulidade. Transbordou, porém, a graça de nosso Senhor com a fé e o amor que há em Cristo Jesus. Fiel é a palavra e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal". Paulo reconhece seus pecados passados de blasfêmia, perseguição e insolência de forma particular, destacando como a graça de Deus o alcançou apesar de suas transgressões específicas.

Esses exemplos bíblicos fundamentam a doutrina de que o arrependimento genuíno não se limita a um vago reconhecimento da pecaminosidade humana, mas envolve a identificação e o reconhecimento individual de cada pecado cometido.

2. A Obrigação da Confissão Particular a Deus

A seção seguinte do capítulo 15 enfatiza: "Como cada homem é obrigado a fazer a Deus confissão particular de seus pecados, pedindo-lhe o perdão deles (e abandonando-os achará misericórdia)". Esta afirmação estabelece a confissão individual como um dever para todo crente que busca o perdão divino.

As referências bíblicas que sustentam esta verdade são o Salmos 51:4,7,9,14: "Pequei contra ti, contra ti somente, e fiz o que é mau aos teus olhos… Eis que eu nasci em iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe… Esconde a tua face dos meus pecados e apaga todas as minhas iniqüidades… Livra-me do crime de sangue, ó Deus, Deus da minha salvação, para que a minha língua cante louvores da tua justiça". Este salmo, uma oração de confissão de Davi após seu pecado com Bate-Seba, demonstra uma confissão direta e pessoal a Deus, reconhecendo a natureza específica de suas transgressões. E também Salmos 32:5-6: "Confessei-te o meu pecado e não encobri a minha iniqüidade; dizia eu: Confessarei ao Senhor as minhas transgressões; e tu perdoaste a culpa do meu pecado. Sendo assim, todo homem piedoso te fará súplicas em tempo oportuno". Este salmo ressalta a importância da confissão para obter o perdão e encoraja todos os piedosos a buscarem a Deus em confissão.

Além disso, temos o texto bíblico de Provérbios 28:13: "O que encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e as abandona alcançará misericórdia". Este versículo estabelece uma clara associação entre a confissão e o abandono do pecado com a obtenção de misericórdia divina.

A passagem de 1 João 1:9 também podemos citar aqui: "Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça". Este versículo reafirma a promessa de perdão para aqueles que confessam seus pecados a Deus.

François Turretin, na sua obra “Compêndio de Teologia Apologética”, no Volume III, detalha o arrependimento real e salvífica, consistindo em contrição, confissão diante de Deus (interna e externa, com auto acusação, condenação e reprovação do castigo, implorando graça) e propósito de correção. Ele enfatiza que a confissão primária é feita no tribunal da consciência, diante de Deus.

Louis Berkhof, em seu livro "A História das Doutrinas Cristãs", observa que os primeiros Pais da Igreja, em harmonia com o Novo Testamento, ressaltavam o "arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo" como meios para obter as bênçãos da salvação. A fé era vista como o instrumento para receber os méritos de Cristo e o arrependimento envolvia o abandono do pecado.

3. A Confissão a Irmãos e à Igreja em Caso de Escândalo

A seção VI deste capítulo da CFW prossegue: "Assim também aquele que escandaliza a seu irmão ou a Igreja de Cristo deve estar pronto, por meio de uma confissão particular ou pública de seu pecado e do pesar que por ele sente, a declarar o seu arrependimento aos que estão ofendidos". Esta seção trata da responsabilidade do crente em confessar seus pecados quando estes causam escândalo ou ofendem outros membros da comunidade da fé.

As referências bíblicas para esta obrigação são Tiago 5:16: "Confessai, pois, os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes curados. A oração do justo, quando eficaz, pode muito". Este versículo encoraja a confissão mútua de pecados entre os crentes, com o propósito de cura e restauração. Lucas 17:3-4: "Tende cuidado de vós mesmos. Se teu irmão pecar, repreende-o; e, se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se pecar contra ti sete vezes no dia e sete vezes vier ter contigo, dizendo: Arrependo-me, perdoa-lhe". Esta passagem enfatiza a necessidade de repreensão em caso de pecado e a prontidão para perdoar mediante o arrependimento manifestado. Josué 7:19: "Então, disse Josué a Acã: Filho meu, dá, peço-te, glória ao Senhor, Deus de Israel, e confessa-lhe; e dize-me agora o que fizeste; não mo ocultes". O exemplo de Acã sendo chamado a confessar seu pecado demonstra a importância da confissão em um contexto comunitário, especialmente quando o pecado afeta a todos. O Salmo 51:1-19 também serve de modelo para a expressão de profundo pesar e arrependimento após o pecado, buscando a restauração tanto com Deus quanto com a comunidade.

O parágrafo especifica que a confissão pode ser particular ou pública, dependendo da natureza do pecado e do escândalo causado. Pecados que afetam diretamente um indivíduo podem ser tratados com uma confissão particular (Tiago 5:16), enquanto pecados que trazem opróbrio à igreja podem demandar uma confissão pública (1 Timóteo 5:20). O essencial é a manifestação sincera do arrependimento e do pesar pelo pecado cometido.

Mais uma vez, François Turretin, na sua obra "Compêndio de Teologia Apologética”, no Volume III, reconhece que aquele que ofende a igreja publicamente deve confessar seu pecado diante dela para ser reconciliado e admitido à comunhão, após dar prova de seu arrependimento. Contudo, ele nega que a absolvição judicial de um sacerdote/padre/pastor seja necessária para isso. Ele também afirma que, se alguém sente sua consciência perturbada por pecados graves, pode buscar a consolação de seus irmãos fieis, especialmente de um pastor, para obter aconselhamento e absolvição do pecado. No entanto, ele enfatiza que tal confissão deve ser livre e não requerida de todos como uma necessidade divina para a salvação.

Herman Bavinck, na obra "Dogmática Reformada”, no volume 3, menciona a distinção bíblica entre tristeza piedosa que leva ao arrependimento para a salvação e a tristeza do mundo que produz morte. O arrependimento genuíno envolve mais do que mero remorso pelas consequências do pecado, mas uma mudança de coração e uma aversão ao pecado em si.

4. Reconciliação e Recepção em Amor

A conclusão da seção VI declara: "Isso feito, estes devem reconciliar-se com o penitente e recebê-lo em amor". Esta afirmação estabelece a responsabilidade da parte ofendida, seja o indivíduo ou a igreja, em perdoar e restaurar o pecador arrependido à comunhão.

Podemos citar para este aspecto o texto de 2 Coríntios 2:8: "Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor". Este versículo, no contexto da restauração de um pecador que havia causado tristeza à igreja de Corinto, exorta os crentes a reafirmarem seu amor e a receberem o arrependido de volta à comunhão.

François Turretin, na mesma obra já citada, descreve o poder da disciplina eclesiástica como possuindo duas chaves: fechar e atar, abrir e desatar (Mateus 16:19). A segunda chave refere-se àqueles que se arrependem sinceramente, que, após a devida reparação, devem ser recebidos novamente à comunhão da igreja e dos sacramentos (2 Coríntios 2:6-8). Ele enfatiza que a excomunhão (o nível mais alto de disciplina) não é uma separação perpétua, mas temporária, visando o arrependimento e a restauração (Gálatas 6:1).

A disciplina da igreja, conforme descrito na Confissão de Fé Westminster, baseada nas Escrituras, tem como objetivo levar o pecador ao arrependimento e remover maus exemplos (1 Coríntios 5:6-7). Os oficiais da igreja devem proceder com repreensão, suspensão da Ceia do Senhor e, em casos extremos, exclusão do rol de membros (Mateus 18:15-17). No entanto, quando o ofensor dá testemunho de seu arrependimento, ele não deve mais ser pressionado, e a reconciliação deve ocorrer, trazendo-o de volta à membresia e comunhão da igreja (2 Coríntios 2:7-8).

5. Implicações Teológicas e Práticas

O ensino sobre o arrependimento e a confissão particular de pecados tem diversas implicações teológicas e práticas importantes.

Teologicamente, enfatiza a soberania de Deus no perdão, que é concedido mediante a confissão e o abandono do pecado, conforme suas promessas (1 João 1:9). Contrapõe-se a visões que atribuem poder inerente a sacerdotes para perdoar pecados de forma judicial, como mencionado por François Turretin ao refutar a doutrina romanista da penitência e por Herman Bavinck ao discutir a confissão auricular. A justificação é vista como um ato de Deus baseado nos méritos de Cristo, recebido pela fé (Romanos 5:1), e o arrependimento e a confissão são evidências da graça transformadora na vida do crente.

Praticamente, este ensino exorta os crentes a uma vida de constante autoexame, reconhecendo suas falhas e buscando o perdão de Deus de forma contínua (1 Coríntios 11:28). Encoraja a honestidade e a transparência nas relações dentro da comunidade da fé, promovendo a cura e a restauração em casos de ofensa e escândalo (Tiago 5:16). A prontidão para confessar e a disposição para perdoar são vistas como marcas de uma comunidade cristã saudável e alinhada com o Evangelho (Mateus 18:21-22).

James Petigru Boyce, na sua obra "Teologia Sistemática", destaca que a obra do Espírito Santo é a aplicação da redenção comprada por Cristo, levando os eleitos ao arrependimento e à fé. Isso reforça a ideia de que o arrependimento genuíno é uma obra da graça divina na vida do crente e a igreja deve reconhecer isso quando um membro admite que pecou e deseja ser readmitido.

Conclusão

Estas duas seções que acabamos de estudar, sobre o arrependimento e a confissão particular de pecados, fundamentado nas Escrituras e explicitado por outros documentos teológicos, enfatiza a necessidade de um exame de consciência individual e específico, reconhecendo cada pecado diante de Deus em busca de perdão e misericórdia. Além disso, ressalta a importância da confissão diante de irmãos e da igreja quando o pecado causa ofensa ou escândalo, visando a reconciliação e a restauração da comunhão em amor. Este ensino promove uma vida cristã de humildade, responsabilidade e busca constante pela graça divina, bem como relacionamentos saudáveis e restauradores dentro da comunidade da fé.

16 abril 2025

Nem satisfação, nem causa, porém necessário: O Papel do Arrependimento para o Perdão

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo XV. Do Arrependimento Para a Vida 

Seção III. Ainda que não devamos confiar no arrependimento como sendo de algum modo uma satisfação pelo pecado ou em qualquer sentido a causa do perdão dele, o que é ato da livre graça de Deus em Cristo, contudo ele é de tal modo necessário aos pecadores que, sem ele, ninguém poderá esperar o perdão.

Seção IV. Como não há pecado tão pequeno que não mereça a condenação, assim também não há pecado tão grande que possa trazer a condenação sobre os que se arrependem verdadeiramente.


A necessidade de reconhecer a própria pecaminosidade e voltar-se para Deus é o pressuposto para a experiência do perdão e da reconciliação com Deus. Vamos entender o conceito de arrependimento e sua relação com o perdão, a natureza do arrependimento como não sendo uma satisfação pelo pecado ou causa do perdão, a livre graça de Deus em Cristo como a fonte do perdão, a indispensabilidade do arrependimento para se esperar o perdão, a universalidade da condenação merecida pelo pecado, e a suficiência do arrependimento verdadeiro para a obtenção do perdão, mesmo para pecados graves.

1) O Arrependimento não como Satisfação pelo Pecado ou Causa do Perdão

A Confissão de Fé de Westminster afirma categoricamente que "não devemos confiar no arrependimento como sendo de algum modo uma satisfação pelo pecado ou em qualquer sentido a causa do perdão dele". Esta declaração estabelece um princípio importante na teologia reformada, distinguindo o arrependimento de noções de auto-justificação ou de mérito humano diante de Deus.

Temos referências bíblicas que sustentam esta perspectiva. Ezequiel 36.31-32 descreve um tempo futuro em que o povo de Deus se lembrará de seus maus caminhos e terá nojo de si mesmo por causa de suas iniquidades e abominações, enfatizando que isso não será feito por amor a eles, mas pela graça divina. Similarmente, Ezequiel 16.61-63 destaca que o reconhecimento da própria maldade e a vergonha precederão o estabelecimento da aliança divina e o perdão, sendo este último um ato da livre graça de Deus.

Louis Berkhof concorda com esta distinção ao criticar a teoria anselmiana da expiação por apresentar erroneamente a punição e a satisfação como alternativas e por reputar os sofrimentos de Cristo como um "tributo voluntário à honra de Deus, um mérito supérfluo que teria servido para compensar pelos deméritos alheios", assemelhando-se à "idéia católico-romana da penitência, aplicada à obra de Cristo". Berkhof enfatiza o caráter objetivo da expiação, baseada na natureza imutável de Deus, e a doutrina penal substitutiva, onde Cristo suportou a penalidade devida ao pecado, e não meramente ofereceu um tributo voluntário. Portanto, a satisfação pela justiça divina é realizada pela obra de Cristo, e não pelo arrependimento do pecador.

2) O Perdão como Ato da Livre Graça de Deus em Cristo

A passagem inicial declara que o perdão "é ato da livre graça de Deus em Cristo", e temos os textos de Oséias 14.2-4, Romanos 3.24 e Efésios 1.7 como fundamentos bíblicos. A ideia central é que o perdão não é algo que o pecador possa merecer ou conquistar através do seu arrependimento, mas sim um dom gracioso de Deus, tornado possível através da obra redentora de Jesus Cristo.

François Turretini reforça essa noção ao afirmar que "a magnitude da corrupção e da impotência introduzidas pelo pecado" demonstram a necessidade de uma ação divina para a conversão e o perdão. A salvação é apresentada como sendo pela graça, em contraste com as obras. Turretini cita Bernardo de Claraval, que afirmava: "A justiça de outro é designada àquele a quem faltava justiça pessoal" e o "meu mérito, pois, é a compaixão do Senhor".

A teologia sistemática de Charles Hodge também enfatiza que a salvação é pela graça, e não pelas obras, entendendo que "ela em nada se fundamenta no próprio crente". O dom do Filho de Deus para a redenção é apresentado como a "mais portentosa exibição de um amor imerecido". A justificação, portanto, não se baseia em algo inerente ao pecador, mas na justiça de Cristo imputada através da fé.

3) A Necessidade do Arrependimento para Esperar o Perdão

Apesar de não ser a causa do perdão, o arrependimento é descrito como "de tal modo necessário aos pecadores que, sem ele, ninguém poderá esperar o perdão", com referências a Lucas 13.3-5 e Atos 17.30-31. Isso aponta para a natureza transformadora da graça divina, que opera no coração do pecador, levando-o ao reconhecimento do seu pecado e ao desejo de voltar-se para Deus.

Wayne Grudem explica que qualquer "proclamação genuína do evangelho deve incluir um convite para fazer uma decisão consciente de abandonar os pecados pessoais e voltar a Cristo na fé, para perdão dos pecados". Ele observa que, embora a fé seja frequentemente mencionada como necessária para a salvação, o arrependimento genuíno e a fé genuína estão tão intrinsecamente ligados que muitas vezes apenas o arrependimento é mencionado, com a fé subentendida.

Herman Bavinck argumenta que a igreja cristã sempre reconheceu que a salvação recebida era um "dom de Deus". A reflexão sobre esse fato levou à compreensão de que a fé e o arrependimento não são meros atos humanos autônomos, mas são originados na "graça eficaz de Deus", precedendo a fé e o arrependimento, inclusive nos adultos.

No entanto, François Turretini ressalta que a graça de Deus não está atada aos sacramentos, e que o batismo, por exemplo, não é absolutamente necessário à salvação, podendo ser substituído pelo desejo e pelo martírio. Isso sugere que, embora o arrependimento interior seja essencial, a ausência de ritos externos por impossibilidade não necessariamente impede o perdão.

4) A Universalidade da Condenação Merecida pelo Pecado

A Confissão afirma que "não há pecado tão pequeno que não mereça a condenação” e podemos comprovar em passagens como Romanos 6.23; Romanos 5.12 e Mateus 12.36. Esta declaração sublinha a seriedade de toda transgressão aos olhos de um Deus santo e justo.

Charles Hodge enfatiza a "espiritualidade da lei divina e a imutabilidade de seus requerimentos", que condenam "qualquer falta de conformidade com a norma de perfeição absoluta exibida na Bíblia". Ele cita diversas passagens bíblicas que atestam que "todos os homens são pecadores". A doutrina do pecado original, como apresentado na Teologia Sistemática de Alan Myatt e Franklin Ferreira, baseia-se em Gênesis 3 e na evidência de que "somos pecadores a partir do nascimento" (Sl 51.5) e que "todos somos pecadores" (Rm 3.10-12). A conexão entre o pecado de Adão e a situação da raça humana em Romanos 5.12-19 reforça a ideia de que o pecado, em sua raiz, traz consigo a condenação.

5) A Suficiência do Arrependimento Verdadeiro para o Perdão de Pecados Graves

Em contraste com a universalidade da condenação merecida, a Confissão declara que "assim também não há pecado tão grande que possa trazer a condenação sobre os que se arrependem verdadeiramente” (Is 55.7; Rm 8.1; Is 1.16-18). Esta promessa oferece esperança e segurança para aqueles que, conscientemente, se voltam de seus pecados para Deus.

A misericórdia divina é um tema central aqui. François Turretini explica que expiar, da parte de Deus, é "aceitar uma expiação feita por um sacerdote por meio do perdão e da remissão do pecado". A reconciliação com Deus, conquistada por Cristo através de sua morte, pressupõe a superação da divergência causada pelo pecado.

Wayne Grudem enfatiza que o convite do evangelho é para abandonar os pecados e voltar-se para Cristo "para perdão dos pecados", sem restringir o alcance desse perdão. A suficiência da expiação de Cristo é tal que pode cobrir até mesmo os pecados mais graves, contanto que haja um arrependimento genuíno.

No entanto, é importante notar que alguns textos bíblicos podem parecer desafiar essa ideia, como as passagens que falam da impossibilidade de restauração para o arrependimento em certos casos (Hb 6.4-8; Hb 10.26-31). Herman Bavinck argumenta que essas passagens se referem a um "pecado muito particular", a "blasfêmia contra o Espírito Santo", e não invalidam a possibilidade de perdão para outros pecados mediante o arrependimento.

6) O Papel da Graça Divina no Arrependimento

É crucial reconhecer que o próprio ato de arrependimento, embora uma resposta humana, é também fruto da graça divina. Como mencionado anteriormente, Bavinck argumenta que o arrependimento se origina na "graça eficaz de Deus". François Turretini afirma que o mesmo Deus que ordena o afastamento da iniquidade opera esse afastamento em nós por seu Espírito.

A capacidade de se arrepender não é inerente ao ser humano caído, mas é um dom de Deus. A “bondade de Deus é que te conduz ao arrependimento” (Rm 2.4). Assim, o arrependimento verdadeiro é tanto um ato de volição humana quanto uma obra da graça divina no coração do pecador.

Conclusão

O estudo destes parágrafos da CFW revela uma compreensão rica e equilibrada do arrependimento e do perdão na teologia reformada. O arrependimento, embora essencial e necessário para se esperar o perdão, não é em si mesmo uma satisfação pelo pecado ou a causa do perdão. Vimos que o perdão é um ato soberano da livre graça de Deus, tornado possível tão somente através da obra redentora de Jesus Cristo. A seriedade do pecado é inegável, com toda transgressão merecendo a condenação divina. Contudo, a misericórdia de Deus é tal que nenhum pecado é grande demais para ser perdoado quando acompanhado de um arrependimento verdadeiro, que é, em última instância, capacitado pela própria graça divina. Esta compreensão teológica oferece uma base sólida para a prática da confissão de pecados e para a confiança na promessa do perdão para todos aqueles que se voltam sinceramente para Deus em Cristo.



15 abril 2025

[Exposição] Uma Falsa Paz | Mateus 7.21-23

21 Nem todo aquele que diz a mim: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no Reino dos céus, mas somente o que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.
22 Muitos dirão a mim naquele dia: ‘Senhor, Senhor! Não temos nós profetizado em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios? E, em teu nome, não realizamos muitos milagres?’
23 Então lhes declararei: Nunca os conheci. Afastai-vos da minha presença, vós que praticais o mal. (Mateus 7.21-23) 


Aqui estamos diante do fim do Sermão do Monte. Nas últimas palavras do Sermão, o próprio Filho de Deus nos confronta com a realidade de que a mera profissão de fé nem sempre garante a entrada no reino dos céus. A mensagem central desses versículos é o perigo do auto engano e da auto ilusão, um tema que ele conecta diretamente à advertência contra os falsos profetas no parágrafo anterior. Ele também ressalta que esses versículos servem para enfatizar que nada tem valor diante de Deus, exceto a verdadeira retidão e santidade.

Consideremos agora esta advertência em 3 pontos, pois ela nos chama para examinar o cerne de nossa relação com Deus.

1) Primeiramente, reflitamos sobre o significado de clamar "Senhor, Senhor"

Muitos podem invocar o nome de Cristo, professar a religião cristã, professar sujeição a Ele e até mesmo usar Seu nome em ministérios públicos, buscando reconhecimento e aceitação. Contudo, nem todos que proferem essas palavras com os lábios possuem um amor sincero e uma fé verdadeira em Cristo — "... este povo se aproxima de mim e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim…" (Isaías 29:13).

A verdadeira entrada no reino dos céus não se resume a uma declaração verbal, mas sim a fazer a vontade do Pai que está nos céus — "Por que me chamais Senhor, Senhor, não fazem o que eu mando?" (Lucas 6:46). Essa vontade, no que concerne aos cristãos, envolve especialmente a fé em Cristo para vida e salvação, a fonte de toda verdadeira obediência evangélica — "E esta é a vontade daquele que me enviou: que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna" (João 6:40).

A ortodoxia, a crença correta sobre Jesus, é essencial — "Todo aquele que confessar que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele, e ele em Deus" (1 João 4:15), mas depender apenas dela é um perigo, pois até os demônios creem — "Crês tu que Deus é um só? Fazes bem. Também os demônios o crêem e estremecem" (Tiago 2:19).

O que devemos ter é a ortopraxia, que é a conduta correta baseada na doutrina bíblica ensinada por Jesus — "Se vocês sabem estas coisas, bem-aventurados serão se as praticarem" (João 13:17). A palavra ortopraxia vem do grego orthopraxia, que significa "prática correta", e é essa prática que evidencia a fé viva — "Assim também a fé, se não tiver obras, por si só está morta" (Tiago 2:17).

2) Em segundo lugar, ponderemos sobre as falsas evidências de salvação que podem nos enganar

No dia do juízo, muitos dirão a Cristo: "Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E em teu nome não expulsamos demônios? E em teu nome não fizemos muitas obras maravilhosas?". É possível pregar a doutrina correta em nome de Cristo, expulsar demônios e realizar muitos milagres, e ainda assim ser excluído do reino. Essas obras, mesmo as mais extraordinárias, podem ser realizadas com motivos errados, buscando a própria glória e não a de Cristo — "Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens" (Colossenses 3:23) — ou impulsionadas pela carne e não pelo Espírito — "Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus" (Romanos 8:14).

Até mesmo a operação de milagres não é prova de que um homem tem fé salvadora. A ênfase naquilo que fazemos em nome de Cristo não deve obscurecer a necessidade de um relacionamento genuíno com o próprio Cristo — "E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti só, por único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste" (João 17:3).

Vejamos alguns exemplos na Bíblia que comprovam que realizar “obras maravilhosas” em nome de Cristo não garante a salvação:

Balaão, embora fosse um profeta que recebeu revelações de Deus, agiu por ganância e foi posteriormente condenado — "Tendo abandonado o reto caminho, desviaram-se e seguiram pelo caminho de Balaão, filho de Beor, que amou o pagamento pela injustiça. Mas ele foi repreendido pela sua transgressão: um animal de carga mudo, falando com voz humana, refreou a insensatez do profeta" (2 Pedro 2:15,16).

Caifás, o sumo sacerdote que profetizou que Jesus morreria pela nação, falou uma verdade espiritual sem sequer compreender seu real significado — "Mas um deles, Caifás, que era sumo sacerdote naquele ano, advertiu-os, dizendo: Vocês não sabem nada, nem entendem que é melhor para vocês que morra um só homem pelo povo e que não venha a perecer toda a nação. Ora, Caifás não disse isto por conta própria, mas, sendo sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus estava para morrer pela nação” (João 11:49–51). Ainda assim, foi cúmplice na crucificação do Messias.

Os apóstolos, incluindo Judas Iscariotes, realizaram milagres, curas e expulsaram demônios — "Tendo Jesus convocado os doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demônios e para curar doenças" (Lucas 9:1). Judas recebeu poder e autoridade sobre todos os demônios, mas ainda assim, traiu Jesus e se perdeu.

Os setenta discípulos também voltaram alegres dizendo que até os demônios se submetiam a eles em nome de Jesus — "Senhor, em seu nome os próprios demônios se submetem a nós!" (Lucas 10:17). Mas Jesus os advertiu: "... alegrem-se, não porque os espíritos se submetem a vocês, e sim porque o nome de cada um de vocês está registrado no céu" (Lucas 10:20), revelando que o verdadeiro motivo de alegria não são as obras, mas a salvação.

Os judeus exorcistas, especialmente os filhos de Ceva, tentaram expulsar demônios usando o nome de Jesus sem o conhecerem de fato — "Os que faziam isto eram sete filhos de um judeu chamado Ceva, sumo sacerdote. Mas o espírito maligno lhes respondeu: Conheço Jesus e sei quem é Paulo; mas vocês, quem são? E o possuído do espírito maligno saltou sobre eles, dominando a todos e, de tal modo prevaleceu contra eles, que, nus e feridos, fugiram daquela casa" (Atos 19:14-16). Foram envergonhados e atacados pelo espírito maligno, demonstrando que o uso do nome de Jesus sem relacionamento com Ele é inútil.

Esses exemplos mostram claramente que operar sinais e milagres ou até mesmo falar verdades espirituais não é garantia de salvação. O que importa é ser conhecido por Cristo — "... se alguém ama a Deus, esse é conhecido por ele" (1 Coríntios 8:3).

3) Em terceiro e último lugar, confrontemo-nos com a terrível declaração: "Nunca vos conheci"

Cristo, o juiz, declara abertamente nunca ter tido amor ou afeição por aqueles que, apesar de suas obras em Seu nome, praticavam a iniquidade. Essa iniquidade pode residir em fazer a obra do Senhor enganosamente, pregando a si mesmos e buscando seus próprios interesses — "Evitem praticar as suas obras de justiça diante dos outros para serem vistos por eles" (Mateus 6:1,2) evidencia que a intenção do coração não pode ser mascarada por obras superficiais.

A ausência da presença de Cristo é o próprio inferno, demonstrando que sem um relacionamento genuíno com Ele, não há verdadeira luz ou vida — "Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha" (Mateus 12:30) reforça o perigo da separação espiritual.

O teste final não são as aparências externas ou os feitos realizados, mas sim a realidade íntima do coração e a genuína busca pela justiça e santidade — "...o Senhor não vê como o ser humano vê. O ser humano vê o exterior, porém o Senhor vê o coração" (1 Samuel 16:7).

John Wesley, parafraseando sobre o verso 23, diz: “nunca houve um tempo que eu o aprovasse; por mais que eles tenham salvado tantas almas, eles próprios nunca foram salvos de seus pecados. Senhor, é o meu caso?”.

John Gill explica que o "conhecer" de Cristo implica afeição e aprovação. Ele também oferece uma interpretação do talmud da frase "Eu nunca te conheci" como significando que Cristo não os admitiria em Sua presença e glória. Gill ainda contextualiza a "iniquidade" praticada por essas pessoas não necessariamente como pecados abertos, mas como fazer a obra do Senhor enganosamente, buscando seus próprios interesses em vez da glória de Cristo.

Aplicação 

• Não confiar apenas na profissão verbal de fé: Meramente chamar Jesus de "Senhor, Senhor" não garante a salvação. É essencial que essa declaração seja acompanhada de um amor sincero por Cristo e uma fé verdadeira nele. Como Paulo esclarece, ninguém pode dizer "Senhor Jesus", senão pelo Espírito Santo. Não podemos confiar na nossa ortodoxia se não há ortopraxia!

• Examinar a motivação por trás do serviço cristão: Mesmo aqueles que pregam, expulsam demônios ou realizam milagres em nome de Cristo podem ser excluídos do reino dos céus se seus motivos forem impuros, buscando agradar aos homens, engrandecer a si mesmos ou promover seus próprios interesses em vez da glória de Cristo. A ênfase deve estar no próprio Cristo e no que Ele fez, e não apenas no que nós fazemos em Seu nome. Pregadores devem ser fieis dispensadores da palavra, buscando a glória de Deus e não a sua própria.

• Desconfiar de evidências superficiais de salvação: Não devemos nos iludir com o fervor emocional ou com a realização de obras impressionantes como garantia de salvação. O fervor pode ser meramente carnal. O poder de realizar milagres ou expulsar demônios pode ser concedido mesmo àqueles que não têm uma fé genuína. O próprio Judas Iscariotes tinha poder para expulsar demônios, mas se perdeu. Devemos alegrar-nos não pelos resultados aparentes, mas por termos o nosso nome escrito nos céus.

• Buscar genuína retidão e santidade: A verdadeira fé em Cristo se manifesta em fazer a vontade do Pai, o que implica uma vida de obediência evangélica e busca por santidade. Coisa alguma tem valor diante de Deus, exceto a verdadeira retidão. Qualquer coisa diferente disso, será como um “Senhor, Senhor!”. Se a nossa ideia de justificação pela fé não incluir a busca pela santificação, então não é o ensino bíblico.

• Aplicar testes de caráter e natureza interior: Em vez de focar apenas nas aparências externas, devemos examinar o caráter interior, buscando os sinais distintivos de um verdadeiro crente, como humildade, mansidão e fome e sede de justiça, conforme ensinado no Sermão do Monte.

• Reconhecer o perigo do autoengano: A auto decepção sobre a nossa salvação geralmente ocorre quando dependemos de falsas evidências. É crucial enfrentar honestamente essa verdade e buscar em Cristo a verdadeira fome e sede de justiça. No dia do juízo, haverá muitas surpresas, com pessoas que foram louvadas neste mundo sendo excluídas do reino.

09 abril 2025

[Opinião] A IPB, confessionalidade e o cuidado com espantalhos

Por Ewerton B. Tokashiki 

Quando você ouvir ou ler um pastor ou qualquer oficial da IPB Ihe advertindo sobre "colocar a nossa confessionalidade acima do evangelho", lembre-se que no capítulo I "Natureza, Governo e fins lgreja", o artigo 1º. declara que "a lgreja Presbiteriana do Brasil é uma federação de igrejas locais que adota como única regra de fé e prática as Escrituras Sagradas do Velho e Novo Testamentos e como sistema expositivo de doutrina e prática a sua Confissão de Fé e os Catecismos Maior e Breve; rege-se pela presente Constituição; é pessoa jurídica, de acordo com as leis do Brasil, sempre representada civilmente pela sua Comissão Executiva e exerce o seu governo por meio de concílios e indivíduos, regularmente instalados"[1].

Não colocamos a nossa confessionalidade acima das Escrituras. Bem como não desprezamos os nossos Padrões de Fé por crer somente nas Escrituras, pois aceitamos que a CFW e os Catecismos Breve e Maior é o "sistema expositivo de doutrina e prática" fielmente extraídos da Bíblia. Apesar da limitação cognitiva ou mera desonestidade de alguns não entenderem isso.

Espera-se e exige-se fidelidade bíblica e honestidade confessional para ser um oficial presbiteriano. Sejamos honradamente, sem espantalhos e sem mentiras, sejamos fiéis em nossos votos e em nossa palavra. A Palavra de Deus nos adverte que "não mintam uns aos outros, uma vez que vocês se despiram da velha natureza com as suas práticas e se revestiram da nova natureza que se renova para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que a criou."(Cl 3.9-10). Que o SENHOR Deus nos preserve em seu temor e santidade.


Fonte: Instagram